Maduro visita Planalto e retoma comércio bilateral, cooperação energética, proteção das fronteiras e combate ao crime organizado entre os dois países. Fluxo comercial caiu desde o Golpe de 2016

Brasil e Venezuela retomaram suas relações diplomáticas depois de quatro anos em que o governo anterior havia suspendido a cooperação entre os dois países. Na segunda-feira, 29, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva recebeu, no Palácio do Planalto, o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro. “Alegria desse momento histórico que estamos vivendo agora. Depois de oito anos, o presidente Maduro volta a visitar o Brasil, e nós recuperamos o direito de fazer política de relações internacionais, com uma seriedade que sempre fizemos, sobretudo com os países que fazem fronteira com o Brasil”, disse Lula.

“A Venezuela sempre foi um parceiro excepcional para o Brasil, mas, por conta das contingências políticas e os equívocos, o presidente Maduro ficou oito anos sem vir aqui, e o Brasil ficou muito tempo sem ir a Venezuela”, comentou. “Temos um pequeno problema de ordem política, de ordem cultural, de ordem econômica e de ordem comercial. Espero que daqui pra frente nunca mais, no Brasil, a gente tenha que romper uma relação por ignorância com a Venezuela”.

Em seu pronunciamento, Maduro fez agradecimentos ao governo brasileiro e falou sobre o futuro das relações bilaterais com o Brasil. “Quero agradecer por toda a atenção, a recepção fraterna e solidária que nossa delegação tem recebido do Brasil e pela preparação desse encontro bilateral”, declarou. “Tivemos uma boa, proveitosa e longa conversa com o presidente Lula, com toda a sua equipe. Fizemos uma revisão de tudo o que diz respeito a essa época de ouro das nossas relações, onde o Brasil e a Venezuela se encontravam cara a cara”.

“Essa ideologização extrema das relações internacionais hoje é um fenômeno que consiste na aplicação de fórmulas extremistas que vão para a direita e buscam qualificar as relações dividindo-as, subdividindo-as, e atropelando-as. E a Venezuela teve a aplicação desse modelo ideológico extremista, que ainda está sendo aplicado”, ressaltou.

“A gente tinha uma relação comercial que teve um fluxo de praticamente US$ 6,6 bilhões de dólares e hoje tem pouco menos de US$ 2 bilhões”, lembrou Lula. “Isso é ruim pra Venezuela e é ruim pro Brasil. Porque o comércio extraordinário é aquele que funciona como se fosse uma via de duas mãos. A gente vende, a gente compra”. Ele ressaltou ainda que Brasil e Venezuela compartilham uma fronteira de 2,2 mil quilômetros. “Não é pouca fronteira, possivelmente essa fronteira é mais extensa do que qualquer país europeu tenha com outro país”, disse.

“Este novo tempo que nós estamos marcando agora não vai superar todos os obstáculos que você tem sofrido ao longo desses anos”, disse Lula. “Eu briguei muito com companheiros sociais-democratas europeus, com o governo dos Estados Unidos. Eu achava a coisa mais absurda do mundo para as pessoas que defendem a democracia, era as pessoas negarem que você era presidente da Venezuela, tendo sido eleito pelo povo, e o cidadão que foi eleito para ser deputado fosse reconhecido como presidente da Venezuela”, criticou Lula, em referência ao oposicionista venezuelano Juan Guaidó, apoiado por uma coalizão de partidos liderada pelos Estados Unidos.

“Eu lembro de uma vez que eu discuti com uma pessoa sobre as reservas de ouro da Venezuela. Eu fiquei sabendo que a Venezuela tinha uma reserva de 31 toneladas de ouro em Londres. E que essa reserva de ouro, ao invés de ser colocada sob a guarda do governo da Venezuela, foi colocada sob a guarda do Guaidó”, relatou o presidente brasileiro.

O presidente também manifestou o desejo de que as relações entre os dois países extrapolem a questão comercial. “É isso que eu desejo e é isso que eu espero: que você [Maduro] contribua conosco para que a relação entre o Brasil e Venezuela não seja uma relação apenas comercial. Ela tem que ser comercial, ela pode ter uma relação política, ela pode ser cultural, ela pode ser econômica, de ciência e tecnologia, das nossas juventudes, construindo parcerias entre as nossas universidades”, sublinhou.

“Portanto, ela pode ser feita, inclusive, com as nossas forças armadas, trabalhando em conjunto na fronteira para que a gente combata o narcotráfico em toda a nossa fronteira. Nós já tínhamos criado uma vez a Secretaria de Defesa da América do Sul, já tínhamos criado uma vez. E é possível criar outra vez. Por isso, Maduro, seja bem-vindo ao meu país”, disse.

Lua mencionou a possibilidade de ingresso da Venezuela nos Brics, um mecanismo internacional de cooperação econômica e desenvolvimento formado por cinco economias emergentes: Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. “Tem várias propostas de outros países que querem entrar nos Brics, e nós vamos discutir, porque não depende da vontade do Brasil, depende da vontade de todos. A gente vai discutir se houver um pedido oficial [da Venezuela], e esse pedido será oficialmente levado para os Brics. E lá nós decidiremos”, disse. Ele disse que é favorável ao ingresso da Venezuela no grupo.

Outro assunto tratado foi a retomada da cooperação energética entre os dois países, o que incluiria o uso da energia da Venezuela para o abastecimento do Estado de Roraima, com o abatimento da dívida que o país vizinho tem com o Brasil. “Não se justifica Roraima ser o único estado fora da matriz energética brasileira, funcionando na base termoelétrica, muito mais cara, muito poluente, e a gente tem condições. O nosso ministro da energia vai conversar com o ministro da energia da Venezuela, e eu espero que o mais rápido possível ele nos convoque”, disse Lula. •

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