Com equipamentos eletrônicos de controle, os usuários podem usar mais de um ônibus pagando apenas uma passagem, sem que a prefeitura precise construir terminais.
Autor: José Carlos Vaz

Com equipamentos eletrônicos de controle, os usuários podem usar mais de um ônibus pagando apenas uma passagem, sem que a prefeitura precise construir terminais.
Autor: José Carlos Vaz

À medida que a cidade cresce, os serviços de transporte coletivo necessitam ser alterados. Os pólos geradores de demanda de transporte deixam de se localizar somente no centro da cidade devido à expansão do território ocupado pela a área urbana e às mudanças nos padrões de uso do solo, fazendo surgir novas necessidades de transporte. A partir de um determinado momento, os usuários passam a exigir possibilidades de deslocamento não somente entre bairros e centro, mas entre um bairro e outro.

A criação desses novos pólos de atração faz com que novas linhas de ônibus sejam criadas, para atender às reivindicações da população.

A rede de transportecoletivo assim constituída está sempre atrasada em relação às necessidades impostas pelas constantes transformações da estrutura urbana. Além disto, é organizada de forma pouco racional, apresentando ociosidade em alguns trechos, superlotação em outros e itinerários sinuosos e repletos de "voltas".

Os usuários dos serviços de transporte coletivo que não se deslocam no sentido radial (centro-bairro) vêem-se obrigados a tomar pelo menos dois ônibus para chegarem ao seu destino. Nas cidades de maior porte, podem precisar de três conduções. São penalizados por gastarem mais dinheiro e mais tempo (em troca de ônibus e em percursos mais longos que o necessário).

AS SOLUÇÕES CONVENCIONAIS

As soluções mais utilizadas para facilitar os deslocamentos inter-bairros e reduzir as irracionalidades presentes no sistema de transportes coletivos utilizam o princípio da integração. Procura-se reduzir os inconvenientes do uso de mais de um veículo para realização das viagens.

É importante notar que a adoção de sistemas integrados de transporte coletivo é praticamente inevitável nas cidades de porte grande e médio. Os custos de oferecer um serviço que permita que todos os deslocamentos se realizem com um único ônibus inviabilizariam o transporte coletivo no município.

Muitas cidades adotam sistemas baseados na integração física. O equipamento mais utilizado é o terminal de passageiros, que concentra diversas linhas que atendem a uma região ou o centro da cidade. A integração física permite que se reduzam irracionalidades no traçado das linhas (comumente identificadas como "voltas" que, além de aumentarem o tempo de viagem, aumentam o custo final do sistema de transportes) e facilita ao usuário a mudança de veículo exigida pela viagem.

Alguns serviços são organizados pelo princípio da integração tarifária. Os usuários que necessitam de mais de uma condução para sua viagem pagam apenas o valor de uma delas ou um valor menor que a soma das duas tarifas unitárias, em geral através da compra de um bilhete na primeira condução que serve como pagamento na segunda. Desta forma, procura-se reduzir a penalização imposta aos usuários que necessitam utilizar mais de um ônibus (ou outro modo de transporte) para realizar seus deslocamentos.

Em várias cidades, há sistemas que combinam a integração física com a tarifária, normalmente através de terminais em que os usuários descem de um ônibus e embarcam em outro, pagando uma única passagem. Esta alternativa tem se difundido muito nos últimos anos.

No entanto, a utilização de terminais de integração física e tarifária apresenta dois grandes inconvenientes:

1. Para que o usuário possa realizar a integração tarifária (pegar o segundo ônibus) ele tem que passar obrigatoriamente pelo terminal, o que pode acarretar, em muitos casos, um tempo adicional de viagem.
2. Os terminais apresentam muitas dificuldades de implantação, como o alto custo de construção, a necessidade de desapropriação de terrenos ou destinação de áreas públicas e o longo prazo para a conclusão da construção. Além disto, a operação e manutenção de um terminal também traz custos adicionais para o município. Muitas vezes, só os custos de desapropriação, onde não há áreas livres, inviabilizam o projeto.

A INTEGRAÇÃO PONTUAL

Os altos custos de implantação e operação de terminais de integração podem, em algumas situações, ser substituídos pela integração pontual. Em vez de depender de terminais, os usuários podem realizar a integração em qualquer ponto da cidade onde haja cruzamento de 2 linhas. Basta descer de um ônibus e embarcar em outro que passe no mesmo ponto ou em um ponto próximo. Para que o controle seja possível, este modelo prevê a instalação de equipamentos automatizados nos próximos ônibus. O bilhete de passagem é válido por um período de tempo pré-definido e dá direito ao usuário, nesse intervalo, de utilizar quantos ônibus quiser, pagando apenas uma tarifa.

Junto à catraca, é instalada uma leitora eletrônica de cartões para cobrança da passagem. Quando o usuário passa na catraca o passe em forma de cartão de PVC (semelhante a um cartão de crédito), a catraca é liberada para o início da primeira parte da viagem integrada. O passageiro deve controlar o tempo restante para realizar a segunda viagem, completando a integração. Após o momento do início, ele tem um número de horas ou minutos de prazo para pegar o segundo ônibus utilizando o mesmo cartão, inserindo o passe novamente na leitora. O tempo de validade da passagem integrada pode variar de uma cidade para outra, ou ser modificado pela prefeitura.

Além da leitora eletrônica, cada ônibus recebe um microcomputador de bordo, que controla a catraca e coleta dados sobre os passes utilizados e as condições operacionais do veículo. Através de um equipamento de rádio-comunicação, estes dados são automaticamente enviados para uma central de computação que realiza o controle geral do sistema.

IMPLANTANDO

A implantação da integração pontual não elimina, por si só, as irracionalidades existentes no sistema de transporte. Sua implantação deve fazer parte de um projeto maior de análise e redefinição do desenho do sistema de transporte coletivo que permita reduzir o seu custo. E deve ser complementado com pequenas intervenções que facilitem a integração física, como redefinição da localização de pontos de parada, instalação de baias de integração nas vias públicas e instalação de abrigos em pontos de ônibus.

EXPERIÊNCIA

Em Ribeirão Preto-SP (446 mil hab.), a Prefeitura está implantando o Sistema de Integração Pontual. Com o novo sistema, todas as linhas de ônibus municipais passarão a operar de forma integrada. Os usuários poderão ir a qualquer ponto da cidade usando vários ônibus sem pagar uma segunda tarifa, no intervalo de duas horas.

Atualmente o novo sistema está em fase de operação-piloto. Com a sua implantação total, o sistema de transporte terá novas linhas que complementarão as atuais, oferecendo novas opções aos usuários. As linhas radiais (centro-bairros) cruzarão com linhas circulares, bastando ao usuário descer no ponto onde as linhas se cruzam e embarcar em outro ônibus. O pagamento da passagem se dá através de um cartão de integração inserido na leitora eletrônica instalada junto à catraca. O sistema conta com dois tipos de passes: simples e integração. Um único cartão pode ser válido para várias viagens.

RECURSOS

O custo de implantação de um sistema de integração pontual varia de acordo com o porte do sistema implantado. Além dos equipamentos instalados nos ônibus, é necessário investir na central de controle, em estudos e projetos operacionais, em treinamento de pessoal, na divulgação das mudanças e em pequenas intervenções nos pontos de parada.

Em Ribeirão Preto, o custo total da implantação é avaliado em cerca de US$ 1,2 milhão para cobrir toda a frota (aproximadamente 250 veículos).

RESULTADOS

a) econômicos

A integração pontual reduz o custo de implantação de um sistema de integração física e tarifária, reduzindo a necessidade de construção de terminais. A economia pode ser aplicada em outros investimentos de melhoria dos transportes como corredores exclusivos e manutenção de vias. No caso de Ribeirão Preto, para viabilizar o mesmo nível de integração (100% das linhas), seriam necessários 10 terminais, ao custo de US$ 300 mil cada, com investimento total de US$ 3 milhões. A integração pontual na cidade tem o custo de implantação de US$ 1,2 milhão (40% do custo de instalar os terminais).

Os equipamentos implantados nos ônibus dispensam a presença de cobrador. Se a prefeitura montar uma rede de venda de passes (em farmácias, bancas de jornais, etc.), é possível reduzir a tarifa. É aconselhável que a substituição dos cobradores seja gradual, associada a um programa de integração profissional, dando-lhes oportunidades de profissionalização.

Os passageiros que necessitam de mais de um ônibus, normalmente os de menor renda, vêem-se livres de parte de seus custos com transporte (que, a menos que a prefeitura implante um sistema de subsídio, são transferidos para os usuários de apenas um ônibus).

b) qualidade dos serviços

Cria condições para a implantação de linhas circulares, interligando os principais pólos de atração de viagens na área urbana.

A integração das linhas do sistema de transporte ganha flexibilidade para alterações de itinerário ou implantação de novas linhas.

A integração pontual reduz os inconvenientes operacionais dos terminais, pois oferece ganhos de tempo e maior liberdade de escolha na composição de viagens.

c) urbanísticos

Evita o impacto negativo dos terminais nas suas áreas de implantação (poluição sonora e atmosférica e degradação dos logradouros onde são instalados). Reduz a necessidade de destinação de áreas para sua construção.

Ao estimular as ligações bairro-bairro, a integração pontual estimula a descentralização das atividades urbanas, e a formação ou consolidação de centros locais como pólos de comércio e serviços, aliviando a área central da cidade.
 


* Publicado originalmente como DICAS nº 19 em 1994

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