Grupo de Conjuntura Fundação Perseu Abramo
18 de maio de 2015

Relações China-Brasil

A visita nesta semana do primeiro-ministro chinês Li Keqiang tem grande importância política e econômica para o Brasil. Acompanhado de uma delegação de 150 empresários, viajará também para Chile, Colômbia e Peru, três países da AP, “Aliança do Pacífico”. Acontece quase um ano após a viagem pela região do presidente chinês Xi Jinping que, na ocasião visitou Brasil, Argentina, Venezuela e Cuba, além de participar da reunião dos BRICS; e em continuidade do Fórum Ministerial China-CELAC, de janeiro de este ano em Beijing.

A China converteu-se na última década no principal sócio comercial da América Latina. No Fórum estabeleceu uma meta de US$ 500 bilhões em comércio e US$ 250 bilhões em investimentos recíprocos para os próximos dez anos.

Interessante notar que os três países da AP  incluídos neste giro têm sido alvo prioritário dos EUA na região com a proposta de integrar o acordo TPP (Parceria Trans Pacífico).  O governo norte-americano quer  criar um área econômica-comercial sob sua hegemonia que exclua a China.  Este giro leva a crer que Beijing deseja consolidar relações comerciais e econômicas com etses países sul-americanos antes que Washington consiga concretizar seu cerco.

Na visita ao Brasil serão assinados vários acordos, que incluem intenções de investimentos calculados em US$ 53 bilhões de dólares no programa brasileiro de infraestrutura (ferrovias, estradas, aeroportos, portos), siderúrgicas e hidroelétricas, para além do tradicional comércio de comodities agrícolas e minerais.

Adicionalmente à importância que esses acordos têm de por si, chegar a resultados concretos na ampliação da relação bilateral com a China certamente fortalecerá a presidenta Dilma  nas negociações previstas com Obama, por ocasião da visita de trabalho a Washington em 30 de junho próximo, quando terá uma agenda preliminar de facilitação do comércio e parcerias no ensino técnico.

Conjuntura Nacional

Os primeiros resultados do ajuste fiscal em curso são, como previsto, ruins para a economia do país e para o governo. O cenário é de aumento do déficit nominal, queda na arrecadação de impostos, incremento da inflação e expansão do desemprego, ao tempo que caem os índices de confiança do setor empresarial sobre o desempenho futuro da economia.

Alguma melhora somente se registra na balança comercial, mais pelo efeito da recessão na queda das importações que por um impulso das exportações Até porque o efeito da desvalorização do real frente ao dólar está sendo parcialmente compensado pelo aumento da inflação no país.

Há indicações de que o governo trabalha com o seguinte cenário. No primeiro semestre de 2015 “já não há muito o que fazer, está contratado”. As MPs que tramitam no Congresso são mais simbólicas do que parte importante das medidas, porque o principal vai se fazer “na boca do caixa”, contingenciando o orçamento.

Assim, o governo trabalha com a expectativa de melhora para o segundo semestre deste ano. Vai ter queda da taxa de inflação porque o principal dos ajustes dos preços administrados já foi feito.  A alta de juros que, mais do que para combater a inflação, tem servido para atrair capitais para financiar o balanço de pagamento, deve parar de subir e pode indicar um viés de baixa.  A desvalorização do real deve ter finalmente um reflexo na recuperação das exportações, e a retomada das obras do PAC também deve se fazer sentir na economia.

Por isso, o correto é olhar para a relação dívida líquida / PIB que se manteve no geral estável. E que em 2014 aumentou como expressão das políticas anticíclicas, assim como aumentou em 2009.

Tal visão tem recebido muitos reparos. Em primeiro lugar, não está se medindo o impacto social e político decorrente de um aumento abrupto do desemprego como o que vem acontecendo. Para um governo do PT tal cenário é muito grave. Em segundo lugar, no Brasil a retomada dos investimentos depende fundamentalmente de dinheiro público, mesmo quando é feito por empresas privadas. E a política econômica atual do governo vem reduzindo sistematicamente as fontes de financiamento público. Em terceiro lugar, há o impacto econômico da operação Lava Jato, que tende a agravar o cenário de queda de investimentos e aumento das demissões em setores chaves da economia.

Há igualmente uma crítica muito ampla ao caráter de ajuste. Certamente poderia ter sido feito um esforço fiscal buscando que arquem os setores sociais com maiores ingressos e riquezas, o que daria mais legitimidade social e política às medidas, conquanto as MPs ajustam sobretudo sobre os assalariados.

O problema não é de agora apenas, já que a justiça tributária é uma matéria pendente nos 12 anos de governo do PT. Mas a questão se coloca agora de forma aguda.

Há pouco peso dos impostos diretos em relação aos impostos indiretos no total da arrecadação do Estado. Enquanto que nos países da OCDE o imposto de renda constitui 8.5% do PIB e 24% da arrecadação total, no Brasil esses indicadores são de 2.7% e 7.6%, respectivamente.

O IRPF sofre distorções pelas deduções das despesas médicas e de educação, que são recursos públicos que acabam sendo utilizados para serviços privados por um setor minoritário da população. Em 2012 deixaram de ser arrecadados R$ 18.3 bilhões por deduções com despesas médicas, o equivalente a 23% do orçamento anual do Ministério da Saúde.

Há espaço também para uma maior progressividade no IRPF. A atual alíquota máxima de 27.5% é baixa quando comparada aos padrões internacionais. Nos anos 1990, no governo FHC, quando foi preciso arrecadar mais, chegou a ser de 35%.  Obviamente há que se observar que neste tema estamos falando sobretudo de “rendas do trabalho” e tal medida atingiria sobretudo à classe média / média alta.

O principal problema do nosso sistema tributário, em quanto a justiça se refere, continua sendo que os altos lucros, as grandes fortunas e patrimônios ou não estão tributados ou estão sub-tributados.

Em suma, os governos no período 2003-2014 equivocadamente não deram prioridade a esses temas, mas a conjuntura e o debate sobre “como distribuir” o esforço fiscal entre a população, exigem dos setores progressistas colocar essa pauta.

Alguns analistas comparam 2015 com 2003 no início do governo Lula. Afora que naquele momento se lidava com a herança maldita dos governos FHC e se iniciava um ciclo de mudanças. O fato é que ao mesmo tempo que houve medidas conservadoras na economia em 2003, eram lançadas iniciativas progressistas na política internacional e na política social. O governo Lula, desde seu início, enfrentou corretamente o debate sobre a ALCA, o que culminou na derrota deste projeto norte-americano em 2005. E lançou uma série de políticas sociais de grande impacto, como acesso ao crédito à população de menos recursos, o bolsa-família etc. Em 2015 a sensação é de que “só tem notícia ruim”.