Oásis para o povo com sede
Em encontro com movimentos sociais, Lula compara o momento atual com a travessia de um deserto, mas garante que o oásis, representado pela sua candidatura, terá água suficiente para todos
Lula recorreu à imagem de um povo que cruza o deserto, sedento, e que se depara com um oásis, para definir o significado de sua candidatura à Presidência da República. No encontro com movimentos populares, realizado sexta-feira, 27, em São Paulo, o ex-presidente, líder nas pesquisas eleitorais, demonstrou confiança na vitória em outubro. “É preciso parar de dizer não ao povo sofrido”, declarou.
“Estava ouvindo o discurso de vocês e imaginando o que está me esperando quando eu voltar a governar este país. Eu falei, puxa vida, este povo está com sede. Este povo está, desde 2016, querendo beber um pouco de democracia, beber um pouco de participação, querendo beber um pouco de respeito, querendo beber um pouco de dignidade, e não deram a eles”, disse.
“É como se a gente estivesse num deserto, todo mundo com sede, e de repente aparecesse um oásis e a gente está correndo pra lá, e a gente não sabe se tem água pra todo mundo. Então, fico imaginando, Alckmin, quando a gente ganhar, essa quantidade de gente correndo, para pedir os direitos que o Estado brasileiro deve a eles, a dificuldade que a gente vai ter, com a sede que eles estão”, discursou, mencionando o ex-governador Geraldo Alckmin, seu companheiro de chapa, que o ladeava no palco da Casa de Portugal, que abrigou o encontro.
Mas a travessia não será em vão. “A cobrança que vocês estão fazendo é uma cobrança verdadeira, é uma cobrança histórica, e a única razão pela qual nós temos interesse de disputar a eleição é a gente poder provar que o Estado brasileiro pode atender e tratar vocês com a dignidade que o movimento social e o povo trabalhador brasileiro precisam”, afirmou. “Naquele palácio cabe o povo brasileiro”, disse Lula, como quem aponta para o Palácio do Planalto como a concretização do oásis que se vislumbra.
Durante o discurso, Lula se referiu com bastante confiança à vitória em outubro. Mesmo quando advertiu que o atual presidente “não é um adversário fraco”, por conta das recorrentes ameaças. “Ele vive dizendo que só Deus vai tirar ele de lá. Pois eu quero que ele saiba que o povo é a voz de Deus e o povo vai tirá-lo de lá”, afirmou.
O encontro de Lula e Alckmin reuniu representantes de 87 organizações dos movimentos sociais. Antes dos discursos, líderes revezaram-se ao microfone para apresentar reivindicações como moradia popular, reforma agrária, emprego, proteção ao meio ambiente e defesa da vida dos povos negro e indígena, alvos constantes da extrema-direita encarnada no bolsonarismo.
Como reflexo da semana que passou, um dos principais clamores foi pelo fim das mortes causadas pela violência policial. Na terça, 24, ao menos 23 pessoas foram mortas na chacina da Vila Cruzeiro, na zona norte do Rio. Apenas um dia depois, foi assassinado Genivaldo Santos, asfixiado na traseira de um camburão da Polícia Rodoviária Federal, à luz do dia e diante de testemunhas que filmaram a cena, em Umbaúba (SE).
Um minuto de silêncio pelos mortos foi pedido por Simone Nascimento, da coordenação do Movimento Negro Unificado. Cartazes com a frase “Justiça por Genivaldo” foram empunhados pela plateia e por Lula e Alckmin. Sem fazer referência direta a nenhum dos dois acontecimentos, Lula afirmou depois, em seu discurso, que é preciso parar de dizer não aos que pedem respeito aos direitos humanos.
“O compromisso que eu tenho é a gente recuperar esTe país para que as pessoas que moram na periferia sejam tratadas com respeito, que tenham acesso aos bens que o Estado tem de oferecer, tudo o que é preciso para viver dignamente”, disse.
As entidades do movimento social entregaram um conjunto de reivindicações, intitulado Superar a crise e reconstruir o país. Entre as propostas, a desmilitarização das polícias e o estabelecimento de mecanismos de controle social junto às forças de segurança. A mudança da legislação de combate às drogas e da política de encarceramento também faz parte das bandeiras apresentadas. “Para que não tenhamos mais Genivaldos nem Vilas Cruzeiros”, entoou um dos participantes do jogral que deu início ao encontro e apresentou, com vozes diferentes, as principais demandas dos movimentos sociais.
Lula ainda lembrou que os mesmos movimentos ali presentes já haviam realizado protestos contra seu governo e o de Alckmin, no quanto estava à frente do estado de São Paulo. Ele estimulou os presentes a manter a postura de cobrança. Segundo o ex-presidente, isso move os governos na direção certa.
Em breve intervenção que antecedeu a de Lula, Alckmin resumiu: “Esse é um momento histórico, com os principais movimentos populares. É assim que se faz. Não é fazendo motociata, mas junto do povo. É assim que se faz um projeto de um governo democrático e popular, em que os movimentos sociais terão vez e voz. Chega de sofrimento e de exclusão”. •