Dados do IBGE mostram que 1% da população ganha 35 vezes mais que os 50% mais pobres. No país 105,5 milhões de pessoas subsistem com apenas R$ 15,10 por dia

 

 

No Brasil de Jair Bolsonaro e do ministro Paulo Guedes, até o que deveria ser boa notícia traz uma iniquidade embutida. A queda da desigualdade de renda em 2020, por exemplo, só ocorreu devido ao auxílio emergencial, política pública negociada e aprovada pelo Congresso a despeito das manobras evasivas do Palácio do Planalto, e que chegou ao fim em novembro.

Dados do IBGE revelam que, no ano passado, o rendimento médio mensal das pessoas do grupo de 1% com melhor rendimento foi de R$ 15.816 por mês. Isso é equivalente a 34,9 vezes o rendimento dos 50% com menores rendimentos — média de R$ 453. Foi um avanço comparado a 2019, quando a diferença era de 40 vezes e bateu o pico da série histórica, após quedas no governo Dilma Rousseff, entre 2012 (38,3) e 2014 (33,5).

Em 2020, houve redução de 9,4% na renda mensal real domiciliar per capita do topo da pirâmide social brasileira, onde vivem os  1% mais ricos. A renda deles caiu de R$ 17.448, em 2019, para R$ 15.816, em 2020. Mas o auxílio emergencial permitiu que a renda média per capita recebida pela metade mais pobre da população brasileira crescesse 3,9% em relação a 2019, quando era de R$ 436.

A pesquisa também apontou que a renda per capita nos domicílios das famílias mais pobres subiu 12,2% entre 2019 e 2020, de R$ 688 para R$ 722. Essa alta, no entanto, ocorreu em um contexto onde, em 2020, o rendimento médio mensal real domiciliar per capita total do país caiu 4,3% ante 2019, chegando a R$ 1.349.

“Houve uma piora do mercado de trabalho. Muita gente perdeu ocupação e todo mundo teve perda (na renda do trabalho), alguns mais, outros menos. Mas você teve uma política social que segurou (os mais vulneráveis). Isso tornou a distribuição de renda do país menos desigual”, explica Alessandra Scalioni Brito, analista do IBGE.

“Houve redução da desigualdade porque todo mundo perdeu, não é porque alguns estão ganhando. É uma notícia que parece boa, mas não é tão boa”, ressaltou a pesquisadora. Para Brito, o auxílio emergencial funcionou como um “colchão” para os trabalhadores, principalmente informais, que perderam as ocupações ou ficaram impedidos de atuar devido às medidas restritivas adotadas no auge da pandemia.

“Foi um colchão, mas não para suprir toda essa queda que teve no mercado de trabalho e em outras fontes de renda”, ressalta. “No Norte e Nordeste, como o peso de programas sociais é maior, aumentou um pouquinho (a renda per capita). Nas outras regiões, não. No Brasil, também não”.

O resultado obtido em 2020, mesmo com o auxílio emergencial, ainda representa 105,5 milhões de pessoas subsistindo com R$ 15,10 por dia. Do total, entre 25 milhões e 29 milhões não sabem onde obterão renda a partir de dezembro, pois foram excluídos do Auxílio Brasil. Para a presidenta nacional do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), este é o legado do bolsonarismo.

“Auxílio Brasil é um programa meia boca feito pro ano eleitoral com data pra acabar. Alunos desmaiando de fome na escola, crianças sem fazer três refeições por dia, pais desesperados sem ter como colocar comida na mesa. Essa é a herança que Bolsonaro vai deixar: descaso e pobreza”, denuncia.

Segundo o IBGE, quase um quarto dos domicílios no país (23,7%) receberam ajuda de algum programa social em 2020 além de Bolsa Família ou Benefício de Prestação Continuada (BPC), principalmente auxílio emergencial, frente a uma parcela de 0,7% em 2019. Além disso, a renda de programas sociais supera a de pensões e aposentadorias em 2020. A parcela da população brasileira que apontou receber outros rendimentos subiu de 7,8% em 2019 para 14,3% em 2020, enquanto de aposentadoria ou pensão caiu de 13% para 12,4%.

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