Por Tânia Maria S. de Oliveira

A cada novo episodio de violência que abala a opinião pública, reaparece a proposta de aumentar penas. Se o autor do crime é menor, a demanda é pela diminuição da maioridade penal. As razões são claras. Acredita-se que é possível combater a impunidade e desencorajar a prática delituosa agravando penas ou criando novos tipos penais. Uma premissa superada há muito pelas experiências internacionais, pelas estatísticas e pelos estudos acadêmicos. Há 250 anos o filósofo italiano Cesare Beccaria assinalou que “não é o rigor do suplício que previne os crimes, mas a certeza do castigo”. É fato que não há relação entre a impunidade e a gravidade das penas.

Nos delitos em geral, os potenciais infratores são desencorajados quando percebem que as chances de serem identificados são grandes. Quando intuem que dificilmente serão descobertos, isto os estimula. O que faz todo sentido. Os índices mínimos de solução de homicídios nos Estados brasileiros dão mostras de que é a impunidade que estimula o crime, não a quantidade ou austeridade das penas.

O tema da maioridade penal está novamente na esfera dos debates no Congresso Nacional, desde o assassinato de um estudante de 19 anos em São Paulo por um rapaz em idade próxima de 18 anos há alguns meses.

Se é legítimo que se pense em solução para os índices de violência, por outro lado é preciso reconhecer que não há, de fato, qualquer razão que justifique a prisão, junto com adultos, de menores entre 16 e 18 anos. Os índices de violência genérica envolvendo pessoas nessa idade são de 0,9%, os de homicídio 0,5%, segundo as estatísticas oficiais da Secretaria de Segurança Pública – SENASP do Ministério da Justiça até dezembro de 2011. Um número muito longe de ser balisador de uma alteração constitucional.

Cerca de 43,7% dos menores que cumprem medida socioeducativa cometeram crimes patrimoniais (furto e roubo); em seguida vem o envolvimento com tráfico de drogas (26,6%). Não por acaso são esses os crimes também responsáveis pelo maior número de encarceramento de adultos no país. O que significa dizer que os menores serão encarcerados em ampla maioria não por cometerem crimes contra a vida (homicídios, 8,4%, latrocínio 1,9%) mas por furtarem ou se envolverem em tráfico de drogas.

Diminuição da maioridade penal – um equívoco de grandes proporções
Fonte: SEDH

Sobre os crimes violentos, para concordar com a redução da idade penal é necessário explicar porque sua curva alcança seu pico entre 21 e 24 anos em todos os países, independentemente da idade penal.

A conclusão é que a alteração da responsabilização penal não contribui para reduzir as práticas delituosas. Se assim fosse haveria menos crimes a partir de 18 anos, quando o que ocorre é exatamente o inverso. Os crimes seguem aumentando após 18 anos até um ponto entre os 21 e 24 anos quando, então, caem consistentemente. São estatísticas oficiais.

Por outro lado, se reduzir a idade penal não mudaria em nada os índices de violência, certamente faria com que os jovens que hoje cumprem medida socioeducativa fossem mandados para os braços das facções criminosas que se organizam nos presídios. O Estado prestaria um grande serviço para o crime organizado.

Por fim, há uma grande confusão nas estatísticas apresentadas em geral, quando confundem responsabilidade penal juvenil – que no Brasil é de 12 anos – com responsabilidade penal – 18 anos.

A ONU realiza, a cada quatro anos, a pesquisa Crime Trends (Tendências do Crime). Em sua última versão, no ano de 2012, constatou que os países que consideram adulto, para fins penais, pessoa com menos de 18 anos são os que apresentam baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), à exceção dos Estados Unidos e Inglaterra.

Foram analisadas 57 legislações penais em todo o mundo, concluindo-se que apenas 17% adotam a maioridade inferior a dezoito anos, dentre eles: Bermudas, Chipre, Haiti, Marrocos, Nicarágua, São Vicente e Granadas.

Os pesquisadores do tema são unânimes em afirmar que a redução da maioridade penal poderá ter efeito contrário ao prentendido: ao invés de inibir a prática de delitos, introduziria de vez crianças e adolescentes no mundo do crime.

A socióloga Camila Nunes dias, pesquisadora do Núcleo de Estudos da violência da Universidade de São Paulo afirmou em matéria divulgada no Jornal O Globo do dia 28/04/2013: “É o maior equívoco a associação da redução da maioridade penal com a entrada de menores no mundo do crime. Não existe espaço mais criminógeno que uma prisão. A entrada precoce da criança e do adolescente na prisão iria favorecer e aprofundar o menor no universo criminal.”

 

Tânia Maria S. de Oliveira é da Liderança do PT no Senado