O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, acabou de retornar de uma viagem pela Europa, onde causou mais dissabores do que fatos positivos que seriam esperados normalmente de visitas oficiais de chefes de Estado. Concretamente, ele se comportou mais como um rinoceronte em uma loja de cristais e conseguiu desagradar tanto os aliados tradicionais dos Estados Unidos, quanto seus adversários e apoiadores domésticos.

A viagem iniciou-se por sua participação em uma reunião extraordinária da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), onde ele classificou os países europeus de “maiores inimigos”, referindo-se à competição comercial dos europeus com os Estados Unidos, criticou a Alemanha por comprar gás natural da Rússia e exigiu que os membros da Otan cumpram a decisão adotada em 2014 de contribuírem para a organização com o equivalente a 2% de seus respectivos PIBs e, em 2023, dobrar o pagamento para 4%, sob a ameaça de retirar-se caso sua proposta não seja cumprida.

Os Estados Unidos são o maior contribuinte da Otan, com o equivalente a 3,58% de seu PIB, e a Alemanha vem em seguida com 1,7%. De fato, a resolução de 2014 ainda é letra morta e muitos de seus membros teriam dificuldades políticas e econômicas para cumpri-la. Afinal de contas, o que justificaria para os eleitores europeus o gasto de 2% e, pior ainda, 4% com a Otan, além das despesas correntes com a segurança doméstica? Por exemplo, a Colômbia acabou de filiar-se à organização e seria difícil imaginar um país com os problemas sociais que tem, contribuir com 2% agora e 4% de seu PIB daqui a cinco anos, além da situação dos países do Leste Europeu. Entretanto, a insistência de Trump em aumentar as contribuições tem pouco a ver com o tema segurança e sim com o comércio, pois a contribuição dos membros da Otan, além da parte financeira, inclui a disponibilização de parte de seu orçamento militar nacional e mobilização de suas forças armadas. O que o presidente estadunidense quer é aumentar a contribuição financeira e ampliar os gastos da organização com a aquisição de equipamento militar e congêneres, dos quais a indústria dos EUA é um fornecedor importante.

O consumo de gás natural importado da Rússia pela Alemanha representa apenas 4% do seu consumo energético, mas Trump pressiona para que este país passe a adquiri-lo dos Estados Unidos, pois ele quer incrementar a produção nacional de petróleo e gás natural por intermédio do fracking.

Na sequência, o presidente estadunidense fez sua primeira visita oficial à Inglaterra, o mais fiel aliado dos Estados Unidos o término da Segunda Guerra Mundial. Além de deixar a rainha Elizabeth II para trás na inspeção da Guarda Real, o que é uma gafe, ele abriu uma bateria de críticas à primeira-ministra, Thereza May, devido à sua proposta de um “Brexit Suave” que incluiria um acordo de livre comércio entre o Reino Unido e a União Europeia, afirmando em entrevistas que este não era o Brexit aprovado no plebiscito. Assim, deu apoio indireto ao ex-ministro de relações exteriores, Boris Johnson, que renunciara alguns dias antes, que é defensor de um Brexit sem maiores concessões e com quem, apesar de ele também ser integrante do Partido Conservador de May, Trump teria mais afinidade ideológica. Novamente, o elemento comércio esteve presente, pois Trump defende a assinatura de um acordo de livre comércio exclusivo entre EUA e Inglaterra.

Por fim, no dia 16, ele se reuniu em Helsinki, na Finlândia, em cúpula com o presidente russo, Vladimir Putin, um encontro que ambos classificaram como positivo, mas do qual pouco se sabe sobre suas conclusões. Imagina-se que as relações bilaterais estiveram em discussão, assim como os temas relacionados ao armamento nuclear e a situação da Síria, Coreia do Norte, entre outros.

Embora a realização de cúpulas de chefe de Estado entre EUA e União Soviética ter sido usual desde a Segunda Guerra Mundial, quando Roosevelt, Churchill e Stálin se encontraram, e várias outras que ocorreram durante a Guerra Fria, até os encontros entre Clinton e Yeltsin, o atual encontro em Helsinki gerou intensa polêmica nos Estados Unidos e tentativas de criar obstáculos à sua realização. Há uma acusação de que o governo russo teria interferido nas últimas eleições presidenciais estadunidenses para prejudicar a candidata Hillary Clinton e favorecer Donald Trump. O promotor especial nomeado para investigar esta acusação, às vésperas da cúpula, indiciou doze russos, agentes do GRU, o órgão de segurança da Rússia, por supostamente terem hackeado dados do Partido Democrata.

A reação de Trump foi declarar que a atividade mais produtiva da viagem fora a cúpula e que de fato as relações entre Estados Unidos e Rússia estavam muito ruins, mas que isso era culpa do governo Obama, e que não acreditava que Putin fosse responsável pelas ações denunciadas pelo promotor. Entretanto, diante dessas declarações a grande imprensa estadunidense, com exceção da FOX, que apoia Trump, os democratas e vários parlamentares republicanos escancararam suas críticas a ele, e o ex-diretor da CIA no governo Obama chegou a chamá-lo de traidor.

Depois disso, como Trump costuma fazer, declarou ter sido mal interpretado e que não foi bem isso que disse, etc etc.

 

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