Houve uma notável dispersão partidária nas últimas eleições, confirmando que o eleitor brasileiro escolhe a pessoa do candidato mais que o seu partido, uma velha tendência que se acentua nas eleições municipais, quando as questões locais predominam e os conteúdos partidários perdem a importância que têm nos pleitos nacionais. A ampliação do leque de partidos também é fator de dispersão, obviamente, e gera a dificuldade de formação de maiorias nas câmaras, exigindo a concessão de vantagens diversas para os vereadores, muitas das quais agridem a ética.

Entretanto, a observação dos resultados alcançados pelos partidos que têm significado político mais nítido aponta para um importante fortalecimento daqueles voltados para o socialismo, PT, PSB, PDT e PCdoB, e um claro encolhimento daqueles de cunho mais liberal, PSDB, DEM e PPS, seja no número de votos obtidos, seja no número de prefeituras conquistadas. 

Reafirmou-se, assim, a tendência manifestada desde 2002, com a continuidade dos ventos que favorecem a navegação política do Brasil na direção de um desenvolvimento econômico-social menos comandado pelo mercado livre, onde prevalecem os interesses do capital, e mais orientado por políticas de Estado que atendem as demandas da população trabalhadora. Reforça-se a busca explícita pela melhor distribuição da renda entre pessoas e entre regiões, e atesta-se a qualidade democrática da política brasileira, na qual os interesses dominantes defendidos pela grande mídia cedem espaço para a afirmação da vontade própria da maioria do povo. Na mesma linha, ainda, fortaleceram-se os partidos que propugnam e sustentam a política externa menos atrelada aos comandos tradicionais dos países mais ricos e mais preocupada com a integração do continente sulamericano.

Enfim, os ventos políticos continuam soprando na mesma direção em que sopraram nos últimos dez anos, o que confere segurança e estabilidade na definição do quadro político brasileiro em prazo médio. O PSB, Partido Socialista Brasileiro, foi o que melhor aproveitou esses bons ventos, logrando um salto realmente formidável. Deu o mote para a grande mídia levantar a possibilidade de uma aliança dos socialistas com o PSDB em 2014, para derrotar o PT, que é o maior desejo dessa oposição mais forte. Eu, pessoalmente,

duvido muito dessa aliança, porque a candidatura de Aécio Neves é a última esperança do PSDB e o objetivo do PSB, como o de qualquer partido, é o poder, é a faixa presidencial; apoiar o PSDB em posição secundária seria uma negação de sua posição ideológica sem grande utilidade política. Em 2018, o PSDB derrotado e cabisbaixo, aí sim, os socialistas poderiam encabeçar a chapa e receber o apoio liberal para enfrentar o PT; faz sentido.

O PT, alvo principal da oposição do capital, continuou crescendo bastante, mesmo debaixo do fogo cerrado do julgamento do mensalão, cuidadosamente preparado pela mídia para coincidir com o pleito. Teve uma perda importante, em Salvador, mas compensou-a com folga com a vitória especial em São Paulo: especial pelo que significou em termos de renovação de liderança na sua principal base política, que é também o Estado eleitoralmente mais forte do País. O PT conseguiu também criar outra nova e importante liderança em Campinas, onde Marcio Porchman cresceu de um patamar zero para uma disputa acirrada no segundo turno.

Ademais dessa renovação em São Paulo, o PT tem uma liderança nova também no Rio, e pode conquistar o governo do Estado em 2014, se conseguir se libertar da aliança pragmática com o PMDB, abençoada pela direção nacional como moeda de troca para a continuidade do apoio peemedebista no País e em São Paulo. Se conseguir essa emancipação, a força hegemônica no principal eixo centro-sul compensará com grande vantagem quaisquer perdas sofridas no nordeste e preparará o partido para um possível embate com o PSB em 2018. E se este for o futuro confronto eleitoral nacional, PT versus PSB, o Brasil terá enfim realizado o seu destino maior no ano do seu segundo centenário, 2022.

Eu não sou cientista político e acredito pouco nas previsões eleitorais que eles fazem. Acho que cientista político é bom para discutir explicações do passado, não para fazer previsões. Alguns são também bons conselheiros nas campanhas eleitorais; o problema é que custam muito caro e seus conselhos, muitas vezes, ultrapassam as margens de tolerância dos limites éticos da política.

 

Roberto Saturnino Braga, ex-senador (PT/RJ), autor de O curso das ideias, editado pela EFPA e membro do Conselho Curador da FPA.