Artigo: O sequestro de Jorge Glas no Equador
Uma campanha pela sua liberdade movimenta ações nas embaixadas do país no próximo dia 12 de setembro
Everaldo Andrade
Nos últimos anos a intervenção dos Estados Unidos nos países latino-americanos se materializou na manipulação da justiça (Lawfare) para perseguir lideranças progressistas falsamente acusadas de corrupção, condenadas sem provas, presas e impedidas de participar da vida política de seu país. A guerra judicial contra o ex-vice-presidente do Equador, Jorge Glas Espinel, levou à sua condenação, em dezembro de 2017, a seis anos de prisão pelo chamado “caso Odebrecht”, que também foi utilizado no Brasil para prender o presidente Lula.
Jorge Glas conseguiu mudar a matriz energética do Equador e viabilizou mais de oito hidrelétricas, permitindo ao país alcançar sua soberania energética. Também dirigiu setores estratégicos como empresas públicas de telefones, de eletricidade, a empresa petroleira, garantindo pela primeira vez que gerassem ganhos e fossem superavitários. Esteve à frente de cinco projetos de telecomunicações para viabilizar milhares de quilômetros de fibras óticas para conectar o povo equatoriano. Essas suas ações despertaram a oposição de poderosos setores econômicos privados contrários às políticas públicas de Estado e defensores das privatizações. Depois de ministro de setores estratégicos, tornou-se vice-presidente do governo do presidente Rafael Correa Delgado no período 2013-2017.
Jorge Glas permaneceu preso até novembro de 2022, período em que ocorreu uma perseguição feroz contra ele. Dois habeas corpus foram revogados por iniciativa direta da atual Presidência da República. Eles negaram seus direitos constitucionais à redução de pena – por bom comportamento – e cumprimento de uma sentença para o regime aberto. Da mesma forma, o Estado equatoriano rejeitou a aplicação das medidas cautelares concedidas pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH).
Em agosto de 2023 o STF (Supremo Tribunal Federal) de Brasil, invalidou as provas principais usadas contra o vice-presidente Jorge Glas no famoso caso Odebrecht. Essa informação foi enviada pelo Supremo Tribunal Federal do Brasil à Procuradoria Geral
do Estado del Equador e, só com esse fato – a invalidação das provas – ou seja, a delação de um funcionário da Odebrecht, já havia elementos suficientes para que Jorge Glas fosse libertado. Contudo, a Procuradoria Geral decidiu que esta documentação enviada pelo STF brasileiro permaneceria arquivada. Depois de ficar preso 5 anos e 4 meses ganhou o direito de liberdade provisória.
Em janeiro de 2023, foi finalmente reconhecido a Glas o direito de cumprir a pena em liberdade, mas as ameaças contra ele continuaram. Logo em seguida o judiciário retomou a ofensiva e reabriu novo processo. Foi nesse contexto que ele pediu asilo e em 17 de dezembro entrou na embaixada de México no Equador. Este país lhe concedeu asilo político em 5 de março de 2024. Porém, ao invés de dar a Glas um salvo-conduto para o México, no mesmo dia 5 de março o governo de extrema-direita de Daniel Noboa organizou uma invasão à embaixada mexicana em Quito, o sequestrou e prendeu num ato sem precedentes, em violação às mais elementares normas diplomáticas internacionais.
A Convenção de Viena, a Convenção de Caracas, ou mesmo as leis equatorianas foram ignoradas na proibição explícita de que a polícia pudesse entrar em uma embaixada sem autorização do responsável pela missão diplomática. O que foi visto, em imagens e vídeos que percorreram o mundo, nunca havia ocorrido. O representante da diplomacia mexicana foi agredido pela política equatoriana durante a invasão e sequestro de Jorge Glas.
Desde esses eventos na embaixada do México em Quito foi formado um Comitê Internacional pela sua liberdade e que integra entidades e personalidades democráticas de toda a América Latina, além de outros continentes. O Diretório Nacional do PT e a Fundação Perseu Abramo apoiam essa iniciativa. A luta pela liberdade de Jorge Glas alimenta e integra a luta contra todas as perseguições judiciais que recaem sobre lideranças progressistas, dos movimentos populares e sindicais de outros países, em particular na América Latina. É uma luta que se conecta com a defesa da democracia, a luta por direitos sociais para as maiorias trabalhadoras e pela soberania nacional do Equador e de todos os países da América Latina.
A deputada equatoriana Sofia Espín, do partido Revolução Cidadã é uma das lideranças de um Apelo Internacional para que todos os defensores da democracia, da soberania
nacional, as organizações de trabalhadores e dos movimentos sociais prepararem delegações às embaixadas do Equador no dia 12 de setembro, uma quinta-feira, para exigir do governo equatoriano. No Brasil o senador Humberto Costa do PT já agendou em Brasília a visita de uma delegação de entidades para o dia 12. Em outros consulados do Equador devem ocorrer também manifestações, com em inúmeros países. Liberdade imediata para Jorge Glas! Concessão de salvo-conduto para o México! Respeito ao direito de asilo!
Everaldo Andrade é integrante do Conselho da Fundação Perseu Abramo e professor de História Contemporânea na USP