Retrato da fome no Brasil
No Brasil de Bolsonaro, um flagrante do flagelo imposto ao povo brasileiro. No Rio, pessoas disputam restos de carne em “caminhão de ossos”. Indignado, Lula reage: “A fome não é um fenômeno da natureza. É falta de vergonha na cara de quem governa esse país”
Um flagrante vergonhoso foi capturada na semana que passou na capa do jornal Extra, com a impressionante foto de pessoas disputando restos de carne em um “caminhão de ossos” no Rio de Janeiro. É a volta da fome no Brasil de Jair Bolsonaro. O aprofundamento da crise econômica e social que o país enfrenta está forçando cada vez mais parcelas mais vulneráveis da população brasileira a recorrer até a itens rejeitados para se alimentar. O caminhão com restos de carne e ossos circula no bairro da Glória, na capital fluminense, e virou ponto de distribuição para moradores que têm fome e não possuem dinheiro suficiente para comprar alimento.
Na quarta-feira, 30, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva responsabilizou diretamente o ex-capitão do Exército que ocupa o Palácio do Planalto pela vexaminosa cena em que pobres disputam restos de ossos e pelanca para se alimentar. “A fome não é um fenômeno da natureza: é falta de vergonha na cara de quem governa esse país”, lembrou Lula, em entrevista à Rádio Capital, de Cuiabá (MT).
Lula lamentou que, depois do Golpe de 2016, que afastou Dilma Rousseff da Presidência por um impeachment fraudulento, o Brasil voltou ao Mapa da Fome, justamente porque o povo não pode contar com o governo. De um lado, não há planejamento estratégico e econômico na gestão da enorme produção de alimentos garantida pelo setor agropecuário. De outro, há o desmonte de programas sociais que mudaram o cenário da desigualdade no país. O Brasil saiu do Mapa da Fome em 2014, no último ano do primeiro mandato de Dilma Rousseff.
“Uma das coisas que eu tenho mais orgulho é de saber que a ONU reconheceu que os programas sociais que a gente tinha colocado em prática tinham tido resultado extraordinário e riscou o Brasil do mapa da fome”, lembrou. A estratégia para isso naquele momento e terá de ser novamente, é entender que “pobre não é problema, é solução”. “O milagre que a gente fez no Brasil foi colocar o pobre no orçamento”, resumiu o ex-presidente.
Levantamento da Rede Brasileira de Pesquisas em Segurança Alimentar e Nutricional informa que mais de 116,8 milhões de pessoas vivem atualmente sem acesso pleno e permanente a alimentos. Dessas, 19,1 milhões (9% da população) passam fome, vivendo “quadro de insegurança alimentar grave”. Os números revelam um aumento de 54% no número de pessoas que sofrem com a escassez de alimentos se comparado a 2018. Mas naquele mesmo ano, ainda no governo Temer, foi justamente quando o Brasil voltou ao Mapa da Fome da ONU.
O relatório mais recente da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) apontou que 23,5% da população brasileira, entre 2018 e 2020, deixou de comer por falta de dinheiro ou precisou reduzir a quantidade e qualidade dos alimentos ingeridos. Os resultados evidenciam que, em 2020, a fome no Brasil retornou aos patamares de 2004. “É um retrocesso brutal o que estamos assistindo no Brasil”, denuncia Lula.
Quando assumiu o primeiro mandato, em 2003, Lula deixou claro, logo nos primeiros dias de governo, qual era o objetivo: combater a miséria no país, promover a inclusão social e garantir que todos os brasileiros fizessem três refeições por dia. Graças às políticas públicas revolucionárias de transferência e distribuição de renda, como o Bolsa Família e o Brasil Sem Miséria, os governos Lula e Dilma retiraram 36 milhões de pessoas da miséria.
Apenas entre 2003 e 2010, 32 milhões de brasileiros saíram da pobreza e entraram na classe média. No ano de 2008, pela primeira vez, a maior parte da população pertencia à classe C, graças à diminuição das classes D e E. O aumento no emprego, no salário mínimo e a oferta de crédito foram fundamentais para que a economia entrasse em um ciclo de expansão e impulsionasse a renda das famílias.
Entre 2002 e 2015, o rendimento cresceu para todos as classes sociais: a renda dos 20% mais ricos aumentou 23% nesse período, enquanto a dos 20% mais pobres superou os 80% de incremento. O coeficiente de Gini, que mede a desigualdade social no país, atingiu o mais baixo índice da história em 2015, quando chegou a 0,49. Quanto mais baixo o índice, menos desigual é o país.
Em 2002, 44% da população pertencia à classe C — composta por pessoas com renda familiar mensal de 2,5 a 11 salários mínimos. Oito anos depois, ela correspondia a 52% dos brasileiros, enquanto a classe E encolhia de 30,5% para 18,5%. No topo da pirâmide, as classes A e B passariam de 13% para 15,5%.