Tradução de Artur Araújo para artigo de Jessica Glenza publicado por The Guardian.

Autoridades devem enfatizar que os temas estão inextricavelmente ligados depois que as pesquisas de boca de urna mostraram uma nação dividida que os vê como separados

Políticos e autoridades que lideram a resposta dos EUA à pandemia de Covid-19 devem apresentar a recuperação econômica e o controle do vírus como inextricavelmente ligados, depois que as pesquisas mostraram que uma nação dividida vê as questões como distintas, dizem pesquisadores de saúde pública e economistas.

As pesquisas revelaram que esmagadora maioria dos eleitores que votaram no presidente eleito Joe Biden identificou a pandemia como seu principal problema, enquanto os eleitores de Trump estavam muito mais preocupados com a economia.

“É possível impedir a Covid-19 e nos salvar da ruína social e econômica, só precisamos ter vontade para fazer isso”, disse Gregg Gonsalves, professor assistente de epidemiologia da Yale School of Medicine, cujo trabalho se concentra em melhorar as respostas às doenças epidêmicas.

Durante toda a pandemia, disse ele, “os economistas diziam o mesmo que a saúde pública – que é preciso parar o vírus”.

A demanda por um novo apelo público ocorre no momento em que mais de 237 mil americanos morreram do vírus, mais de 10 milhões foram infectados e as próximas semanas provavelmente trarão os piores surtos de toda a pandemia.

Autoridades de saúde pública informaram que deverão enfatizar tanto que os americanos devem usar máscaras, manter distanciamento social e evitar situações de alto risco assim como que ninguém no sistema de saúde deseja outro bloqueio econômico. Dualmente, afirmaram, a ênfase deve estar em que a economia não se recuperará se o vírus continuar a se espalhar descontroladamente.

“A economia é muito, muito importante para as autoridades de saúde pública”, disse o Dr. Marcus Plescia, diretor médico da Associação Estadual e Territorial das Autoridades de Saúde.

“Todos na saúde pública estão preocupados com a devastação econômica resultante de uma pandemia”, acrescentou. “Mas é a pandemia que está causando isso, não a resposta à pandemia.”

Os economistas também estão preocupados com um eleitorado dividido, que considerava a saúde pública e as questões econômicas separadas. Williams Spriggs, professor de Economia da Howard University e economista-chefe da AFL-CIO, disse que seu campo profissional falhou em reconhecer a tarefa à sua frente quando a pandemia se instalou.

“O que podemos ver a partir dos dados – foi a doença que desacelerou a atividade econômica”, disse Spriggs. “Quer recebam ordens para ficar em casa ou não, [o vírus] deixa as pessoas desconfortáveis ​​em se reunir em espaços públicos, entrar em aviões, ficar em hotéis”.

As pesquisas de boca de urna costumam ser confusas e, mesmo em anos normais, fornecem apenas um esboço de como os diferentes grupos demográficos votam. Os especialistas acreditam que 2020 pode pintar um quadro ainda menos confiável, porque muitas pessoas votaram via postal.

Além disso, Trump superou amplamente as expectativas dos pesquisadores, levantando questões mais amplas sobre a confiabilidade das pesquisas. No entanto, se os números atuais se mantiverem após a validação da pesquisa, há uma grande divisão nos EUA sobre como combater a pandemia de forma eficaz.

Trinta e cinco por cento dos eleitores classificaram a economia como sua principal preocupação, mais do que o dobro do número que classificou a pandemia como a questão mais importante que o país enfrenta. Além disso, as pessoas que viam a economia como o principal problema também se dividiam intensamente, com 82% de eleitores pró Trump, 82%contra 17% para Biden, conforme pesquisas do New York Times.

Aqueles que classificaram a pandemia como principal problema apoiavam esmagadoramente Biden, 82% contra 14%. Os eleitores de Biden também eram mais propensos a realmente ter experimentado os impactos econômicos e de saúde da pandemia, enquanto os eleitores de Trump tendiam majoritariamente a ganhar mais de US$ 100 mil por ano e a classificar a situação econômica de sua família como "melhor hoje".

“Particularmente no início, quando cessamos as atividades, essa é uma ação muito ousada na economia e acho que realmente impressionou as pessoas”, disse Plescia. “Mas talvez eles tenham perdido de vista o fato de que há uma razão para estarmos fazendo isso.”

Alguns dos principais especialistas em saúde pública do país criticaram sua própria capacidade de transmitir mensagens complexas ao público após um confinamento calamitoso na última primavera.

“Não acho que todos nós da comunidade de saúde pública fizemos um bom trabalho enviando mensagens claras”, disse o Dr. Ashish Jha, reitor da Escola de Saúde Pública da Universidade Brown, ao NPR News. Ele acrescentou: “Controle o vírus e podemos abrir muito mais a economia”.

Cientistas e pesquisadores também esperam que o fim de uma presidência conhecida por espalhar teorias da conspiração, amordaçar cientistas e espalhar desinformação leve mais americanos a um conjunto de fatos em comum. Segundo uma análise notícias sobre o coronavírus, Trump alimentou 38% das manifestações de desinformação, tornando-o uma das maiores fontes do mundo, de acordo com pesquisadores da Cornell University (https://khn.org/morning-breakout/trump-fueled-38-of-pandemic-misinformation-conspiracies-study/)

Uma das linhas centrais de ataque de Trump foi que os pesquisadores de saúde pública e Biden queriam outro confinamento, comparando as políticas de saúde a um "Estado-prisão". Da mesma forma, os aliados de Trump tendem a posicionar a saúde econômica e social como em oposição entre si, ao invés de complementares.

Gonsalves descreveu a estratégia de Trump como "deixar a pandemia seguir seu curso e culpar a saúde pública pelo colapso econômico e social [que Trump] poderia ter evitado desde o início".

Spriggs disse que algumas das questões mais importantes da pandemia estão à espera do governo Biden-Harris. “Esta doença tem sido muito perturbadora, e os verdadeiros desafios que ainda não analisamos são os relacionados ao que vem depois”, disse ele. “Se emergirmos e as únicas coisas ainda em pé forem a Amazon e o Walmart, o que isso significa?”