Henry Campos e Nahuan Gonçalves
Quando a pandemia da Covid-19 continua a por em risco, diariamente, milhões de vidas, incluindo trabalhadores da saúde, pessoas idosas e aquelas com comorbidades pré-existentes, uma pergunta é desafiadora: quem deve receber primeiro a vacina?
Esta semana a Organização Mundial da Saúde – OMS divulgou diretrizes preliminares sobre a priorização de grupos. Essa recomendação vem somar-se a um plano inicial de alocação, liberado no início do mês pela US National Academies of Science, Engineering and Medicine – NASEM.
Ambos os documentos vêm sendo elogiados por especialistas por terem levado em conta a escalada histórica e a epidemiologia única da COVID-19. Um ponto muito exaltado é a recomendação da NASEM de inclusão, nas diretrizes, de minorias raciais e étnicas, ao considerar no seu plano os fatores socioeconômicos que colocam essas pessoas em risco. Embora esse plano tenha diferenças com o da OMS, que ainda precisa de detalhamento, “é importante ter grupos diversos analisando o problema”, ressalta o médico Eric Toner, especialista em pandemias, que fez um planejamento da mesma natureza no John Hopkins Center for Health Security, Baltimore, Maryland. Toner diz ainda que “é alvissareiro que há um consenso de opinião sobre esses pontos”.
Enquanto o plano da OMS lista apenas os grupos que devem ter acesso prioritário à(s) vacina(s), as diretrizes emanadas da NASEM vão mais à frente, estabelecendo um ranking ordenado por grau de prioridade de quem deve receber a vacina. O plano da NASEM prevê cinco fases, com percentuais estabelecidos para a população americana: Fase 1 – trabalhadores da saúde e primeiros respondedores (5%); Fase 2 – pessoas com condições subjacentes que as colocam em risco de forma de forma severa da COVID-19 ou de morte, e idosos em ambientes densamente povoados (10%); Fase 3 – trabalhadores de serviços essenciais com alto risco de exposição, idosos ainda não tratados e pessoas com condições subjacentes que colocam-nas em risco moderado (35%); Fase 4 – adultos jovens, crianças e trabalhadores de serviços essenciais com risco aumentado de exposição; Fase 5 – os demais residentes (5-15%). Uma questão desafiadora é o estabelecimento do número de pessoas a serem priorizadas em cada fase, diz a bioeticista Ruth Faden, do John Hopkins Berman Institute, Baltimore, Maryland, pelo risco de que “um grande número de pessoas em cada grupo exerça pressão para ser colocado na linha de frente”.
Ambos os planos abordam o acesso dos grupos vulneráveis, e as diretrizes da OMS recomendma que países ricos assegurem que os países pobres começarão a receber vacinas logo no início da alocação, para que não se repita o ocorrido na pandemia de H1N1, em 2009, “quando as vacinas chegaram aos países de baixa e média renda, a pandemia havia acabado”, registra a Dra. Faden. Uma questão ainda não tratada no documento da OMS é a tensão que ocorrerá para definir a alocação entre os diferentes países, ou seja, devem os países mais atingidos receber maior alocação da(s) primeira(s) vacina(s) antes que outras nações comecem a imunizar os seus grupos de alta prioridade?
A NASEM vem trabalhando nos Estados Unidos em articulação com o US Center for Diseases Control and Prevention – CDC e o National Institutes of Health – NIH. Essas instituições recomendam que a vacinação dê prioridade a “populações de alto risco”, que têm sido mais afetadas pela COVID-19, com mortalidade desproporcionalmente mais elevada. A interpretação dessas instituições é que a vulnerabilidade desses grupos deve-se a fatores econômicos ligados ao racismo sistêmico, já que, por exemplo, as pessoas que compõem esses grupos têm trabalhos de alto risco e moram em áreas de alto risco, o que revela o emprego, nessa análise, de novas lentes, que não separam as pessoas por sua identidade étnica ou racial.
Todas essas instituições preparam suas diretrizes finais conscientes de que esses planos, ao serem postos em prática, estarão submetidos à influência do contexto político.
Para ler mais: www.science.com
www.bmcmedethic.biomedcentre.com
www.nationalacademies.org
www.who.org.br