O avesso do avesso – o orçamento impositivo
Por Zezéu Ribeiro
Orçamento impositivo só pode ser justificado pela prioridade dada pela sociedade a determinada política pública.
Aquelas questões, poucas e bem definidas, que têm que ser imediatamente enfrentadas a curto prazo (via Lei de Diretrizes Orçamentárias – LDO) ou a médio prazo (via Plano Plurianual – PPA) e que sejam resultado de um processo interativo entre os poderes institucionais e a sociedade, como os orçamentos participativos já levados a prática nas três esferas de poder (municipal, estadual e federal). O que foi aprovado na Câmara Federal é o “avesso do avesso” da democratização do orçamento!
Inicialmente por valorizar a prioridade pela origem e não pela finalidade, ou seja, o orçamento impositivo por ter origem no desejo do parlamentar e não pela definição social e institucional de sua finalidade, objeto de política pública.
Por consequência, se torna “imoral, ilegal e engorda”, não respeitando os princípios de qualquer legislação, seja o da impessoalidade, o da moralidade ou da legalidade.
Cada emenda adquire o caráter pessoal, quando vincula a lei (o orçamento) à sua origem, rasgando o princípio da impessoalidade além de seus aspectos paroquiais e dispersivos, contrários a almejada prioridade às políticas públicas específicas.
É necessário que defina a prioridade e, a partir dessa premissa, o não contingenciamento e a obrigatoriedade da execução de todas as suas rubricas, independentemente de sua origem, parlamentar ou executiva.
Salvo engano, nenhuma das centenas de manifestações, ocorridas nos últimos meses no país, tiveram como reivindicação a aprovação do orçamento impositivo. No entanto, essa foi uma das primeiras matérias apreciadas pela Câmara dos Deputados após o recesso parlamentar.
Mais uma vez abrimos mão de fazer uma discussão séria sobre a transparência no planejamento e fiscalização da gestão orçamentária. Optou-se por aprofundar a “privatização” e a personificação da execução do orçamento.
Na prática, cerca de 1% das receitas líquidas da União, ou R$ 6,8 bilhões, deverão obrigatoriamente ser destinadas ao atendimento de emendas parlamentares ao Orçamento, sem necessidade de respeito a qualquer planejamento ou critério técnico, obedecendo apenas a prioridade definida pelo parlamentar.
Se atualmente é passível de crítica a forma como se dá a liberação dos recursos das emendas parlamentares, não podemos, a pretexto de uma pretensa equidade, institucionalizar essa personificação no uso das emendas, que devem ter origem e não propriedade.
A questão de fundo é mais uma vez esquecida: o Orçamento precisa deixar de ser uma peça de ficção, com cada um pensando nos seus objetivos paroquiais ou eleitorais.
É preciso dar transparência ao processo de sua discussão e aproximar o cidadão comum desse debate, pois esse é o primeiro passo em direção a uma verdadeira democracia: envolver os cidadãos na definição do uso do recurso público. Esse é um anseio que, com certeza, foi registrado nas ruas.
Infelizmente a Câmara Federal optou pela “privatização” do Orçamento, inserindo na Constituição Federal a ideia de que a lei tem dono.
Zezéu Ribeiro é deputado federal pelo PT da Bahia