Correa: “Problema da América Latina sempre foi a elite, que nunca trabalhou para o bem comum”
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Ainda antes de ser reeleito como presidente do Equador, Rafael Correa definiu a consolidação de sua Revolução Cidadã como seu principal objetivo para os próximos quatro anos.
Vencedor do pleito do último domingo com mais de 55% dos votos e sem a necessidade de disputar um segundo turno, Correa coloca a elite dominante e a imprensa do país como os maiores adversários de seu governo. “Eles nunca trabalharam para o bem comum.”
Em entrevista realizada um dia depois das eleições, o presidente equatoriano também analisa a situação política da América Latina, critica a política externa de Barack Obama para a região e fala sobre seus planos para 2017, quando pretende deixar a vida pública.
Russia Today (RT): Para começar, gostaria de saber como passou a noite de sua vitória. Teve tempo para dormir o descansar um pouco?
Rafael Correa: Nesse trabalho, não há muito tempo para descansar. Chegamos em casa à 1h da manhã. Faço o possível para não perturbar a vida cotidiana de minha família. Então, às 7h levo meus filhos à escola e dali vou para o Palácio, continuar trabalhando. Temos cansaço acumulado. Já estamos habituados.
As pesquisas previam 60% dos votos. Acertaram (com 70% das urnas apuradas, Correa tem 57% dos votos).
É, foram bem precisas, porque havia indecisos. Temos alguma experiência… Tínhamos 62-61%, mas havia cerca de 20% de indecisos, os que não se haviam decidido por proposta forte como a nossa; o mais provável é que escolhessem outros setores políticos. Assim, sabíamos que os números poderiam ser menores. Seja como for, começamos a campanha com 52%. Nosso objetivo era não perder nenhum desses votos. Começamos a subir e chegamos a 57-58%. Só tenho a agradecer ao povo equatoriano.
Mas não houve nervosismo…
Algum nervosismo sempre há. Trabalhamos, na campanha, como se não tivéssemos nenhum voto. Foram 32 dias muito intensos, fiquei sem voz, mas foi uma bela campanha, bastante bem coordenada, com mensagem profunda. Tudo funcionou quase perfeitamente: equipe de campanha, organização política, autoridades, militantes, os comitês da Revolução Cidadã, que são grupos de cidadãos que se organizam para dar apoio a essa revolução. E aí estão os resultados. São resultados contundentes. E insisto: só tenho a agradecer ao nosso povo. Claro, também, que mantenho o compromisso de não falhar com os equatorianos.
O senhor diz que foi uma bela campanha. Mas o senhor criticou os meios eletrônicos e há boatos de que a CIA prepara um golpe para desestabilizar o Equador. De que se trata, exatamente?
Foi uma bela campanha, de nossa parte, porque foi com alegria, música, um programa muito bem elaborado de governo, resumido em 10 eixos, com 35 propostas muito concretas. Sinceramente, é o melhor plano de governo da história do Equador.
Mas, sim, enfrentamos campanha suja, na qual intervieram serviços de inteligência daqui e do exterior. Alguns dos nossos opositores, os menos éticos, são militares da reserva, com experiência em inteligência, os quais, quando não conseguem vencer nas urnas, trabalham para destruir a moral, agridem a família, agridem a honra de amigos nossos. Tivemos, sim, algumas dessas patrañas e, sim, foram organizadas, principalmente, pelas redes sociais. Graças a Deus o povo equatoriano soube ignorá-las. A CIA também… falou-se, mas nada foi provado, que haveria 87 milhões de dólares para financiar a oposição, com o objetivo de desestabilizar o governo, para impedir que vencêssemos e, no caso de vencermos, como aconteceu, para nos desestabilizar. Não se pode nem confirmar nem desmentir essas denúncias gravíssimas, sem investigação muito mais profunda.
Sua imagem não foi abalada durante a campanha?
Não. Mas sem dúvida houve campanha suja. E a campanha de sempre, de alguns veículos que tomam partido e não fazem o trabalho de informar.
Em 2010, houve aqui uma tentativa de golpe de Estado que ninguém previu naquele momento. Deve-se esperar algo parecido agora? Provocação semelhante?
Não se pode excluir completamente o risco. Olhe à volta: o contexto daquele golpe de Estado foi a imprensa desinformando… E os membros da oposição política, que se diz democrática, foram os primeiros a apoiar os golpistas, pediram a renúncia do presidente – o mais violentamente agredido. Tomaram medidas para desestabilizar o governo. E agora, na campanha, proclamavam o quanto respeitam a Constituição.
Evidentemente, não se pode excluir o risco da imprensa corrupta – porque também há melhor imprensa –, a imprensa que nada tem de ética, a mesma imprensa que já não tem poder para impor e derrubar presidentes. Ontem, ficou demonstrado. Mas, sim, aquela imprensa corrupta ainda tem capacidade para provocar grande dano. Sempre podem difundir alguma outra mentira, que, sim, pode nos prejudicar muito. Por isso, não se exclui essa possibilidade. Temos de nos manter muito atentos, sempre, a essas tentativas de desestabilizar governos eleitos.
Grande parte do que houve dia 30/9/2010 aconteceu porque a imprensa informou mal, disse aos policiais e militares que perderiam benefícios, salários, até as medalhas… De fato, foram canceladas várias dessas coisas, que, em seguida, foram unificadas em salário muito maior. Mas isso, precisamente, a imprensa não informou. Enganaram muita gente. E, sim, podem criar outra vez clima semelhante. É preciso atenção extrema.
Seu opositor nessas eleições, Guillermo Lasso, que alcançou 24% dos votos, disse que o senhor é o presidente dos ricos.
Eu?! Considero Guillermo Lasso homem inteligente e não acredito que tenha dito tal coisa. Até que o ouça dele mesmo, dou-lhe o benefício da dúvida, porque seria a maior tolice que Lasso jamais disse. E, afinal, não chegará aos 24%. Faltam alguns votos.
Mas há quem diga também que algumas reformas feitas no país, reformas tributárias, por exemplo, funcionam em benefício só dos ricos. O que o senhor tem a dizer?
Que reforma tributária beneficiou só os ricos? [risos]
Foi o que disseram os opositores.
A única proposta de todos os demais candidatos foi reduzir impostos. Porque, pela primeira vez no Equador, os ricos pagam impostos. A evasão ficou impossível. Antes, eles nem se preocupavam se os impostos eram altos ou baixos, porque não pagavam imposto algum, sonegavam e nada lhes acontecia. Por isso, agora que a sonegação e a evasão ficaram impossíveis, a proposta de eliminar todos os impostos foi derrotada nas urnas, já duas vezes. Mas os ricos nunca pagaram impostos e agora pagam. Duvido, sinceramente, que Guillermo Lasso, pessoa inteligente, tenha dito tal barbaridade. Em todo o caso, é extremamente claro quem é o candidato das elites no Equador.
No ano passado, houve muita polêmica em torno do caso de Julian Assange. Quais os objetivos do Equador, quando decidiu dar-lhe asilo?
Que polêmica? Por que teria havido polêmica? Da próxima vez que a Suécia, onde vivem muitos asilados latino-americanos, decidir dar asilo a alguém, também haverá ‘polêmica’? Na minha opinião, há, nessa história, muito de neocolonialismo. Este governo, este presidente e este país não aceitarão essas manobras. Não temos de pedir licença a ninguém para exercer nossa soberania. É figura definida, bem claramente, no direito internacional. O Equador exerceu a própria soberania, nos termos do Direito Internacional, e não devemos explicações a ninguém, nem temos de pedir desculpas, nem de pedir autorização a seja quem for.
Na prática, toda a solução da questão Julian Assange depende hoje da Europa. Se, amanhã, a Grã-Bretanha lhe dá o salvo conduto, acaba o problema. Se a Suécia o interrogar, como a lei sueca admite, por vídeo, como pode fazer ou enviando um Promotor à Embaixada do Equador em Londres, como também pode fazer, acaba a confusão. Assange foi convocado para interrogatório. Não há nem sequer acusação formal contra ele, de coisa alguma. Se o advogado do Sr. Assange nas cortes europeias, o Dr. Baltasar Garzón, obtiver autorização para que o asilado deixe a Embaixada do Equador em segurança, acaba-se a questão. Agora, tudo depende da Europa. O Equador fez o que tinha de fazer, no exercício de sua soberania. Não pedimos nem vamos pedir licença a seja quem for. Não devemos desculpas a ninguém, nem explicações. País algum jamais pediu desculpas a alguém, por exercer a própria soberania.
E quando o senhor supõe que se resolverá isso?
Amanhã, se a Grã-Bretanha quiser resolver. Mas há aí muita soberba, muita arrogância, muito de neocolonialismo. Querem de nós explicações por conceder um asilo? Como assim? O que significa isso E querem também que revertamos decisão já tomada. Não o faremos. Nunca.
O senhor acredita, como o próprio Julian Assange, que pode acontecer de ele ser extraditado para os EUA, não para a Suécia?
Bem… Havia alta probabilidade. O caso do Sr. Assange foi estudado detidamente, durante várias semanas, aqui no Equador. Entendemos que aquele pedido de asilo tinha fundamento e concedemos o asilo.
Digamos que, ontem, não foi noite só de sua vitória, que foi uma pequena vitória também para Hugo Chávez, que voltou à Venezuela. O senhor foi dos primeiros a visitá-lo em Cuba e dedicou sua vitória também a ele. O que sabe de seu estado de saúde e quando imagina que possa voltar às suas funções?
Bem, estive com ele antes da operação, sem dúvidas operação delicada, mas quem o visse, sem saber da doença, diria que estava perfeitamente normal, com bom ânimo, muito bom aspecto. Mas, sim, que se tratava de operação delicada, todos sabíamos. A notícia que temos é de que se está recuperando. Excelente notícia, que tenha podido voltar à sua amada Venezuela. Ama Cuba, mas a Venezuela é sua pátria, a terra natal, e estou certo de que estar em casa será o melhor remédio para a rápida recuperação de Hugo. Desejo-lhe rápida recuperação. Que não seja cabeça dura. Das primeiras coisas que fez, depois de agradecer à Venezuela, foi mandar-me felicitações… Ele agora tem de não pensar, por uma semana, no que acontece na América Latina e concentrar-se na recuperação.
O senhor acredita que a recuperação seja possível?
Não sei. São desejos. Não sei se realizarão.
Digamos, no caso de que Hugo Chávez não possa voltar às funções de antes. O senhor está disposto a assumir papel mais importante na América Latina?
Sempre me fazem essa pergunta e, com todo o respeito, o que mostra é desconhecimento do que se passa na América Latina. Quem aqui está buscando algum protagonismo? Hugo tem liderança natural.
Mas a questão existe, na arena internacional. Vê-se como…
Há alguns fatos, há práticas, mas ninguém busca ascensão continental. Essas coisas não funcionam assim, entre nós: se vou ser novo líder depois de Hugo, mas Hugo está aí e continua. Então eu seria o vice-líder. Nada disso funciona assim, aqui. Estamos aqui para servir o povo, ninguém está procurando… E falo por mim, por Cristina, por Evo, por Hugo, por Dilma, por todos os coordenadores desse processo de mudança histórica na nossa América Latina. Nenhum de nós busca poder para si, nada queremos para nós; queremos tudo para os nossos povos. Estaremos onde o povo mais necessite de nós, como o mais humilde dos cidadãos, como qualquer operário que constrói a pátria todos os dias, o camponês ou o presidente da República, mas sempre para servir ao povo, sem ambições pessoais.
Barack Obama foi reeleito. Hugo Chávez e o senhor, também. Todos os atores chaves nesse hemisfério mantêm as respectivas posturas. Até que ponto, com os mesmos jogadores, pode mudar a situação no continente?
Mudar em que sentido?
No sentido das mudanças que esse bloco queria. Para a Revolução Cidadã, por exemplo.
Entendo que o presidente Obama seja boa pessoa, mas infelizmente nada mudou na política externa dos EUA. A moral dupla prossegue. Insistem em dar-nos aulas de Direitos Humanos e tal, e mantêm as torturas em Guantánamo. Se os grandes ditadores por aqui, os mesmos que massacram sua gente, se são aliados incondicionais dos EUA, viram grandes democratas, e são promovidos, dão-lhes emprego e os põem a dar aulas em Washington. E presidentes totalmente democráticos, você viu, ontem, como esse que aqui lhe fala, que dá a vida em defesa dos direitos humanos de seus cidadãos, se não somos seguidores incondicionais de Washington, somos nós os ditadores, os que atentamos diariamente contra a liberdade de imprensa, contra as liberdades fundamentais. Isso, infelizmente, não mudou.
Repito que o presidente Obama parece ser bom ser humano, boa pessoa, mas a política externa dos EUA, sobretudo para a América Latina, absolutamente não mudou. E tem de mudar, porque essa dupla moral é inaceitável.
Depois de vencer as eleições, o senhor disse que sua meta é que a Revolução Cidadã seja irreversível. Mas que passos devem ser tomados para que assim seja?
Temos de acabar de consolidar a nova instituição do Estado. O ponto de partido é mudar as relações de poder. O problema da América Latina sempre foi as elites dominantes. Nunca foram elites progressistas, modernizadoras, que trabalhassem para o bem comum. Foram elites que se apropriaram dos frutos do progresso técnico e apropriaram-se deles de forma excludente, para ter seus bairros exclusivos – em um dos quais mora o Sr. Lasso, que diz que eu representaria as elites.
A senhora, se quiser entrar no condomínio onde mora o Sr. Lasso, onde há lagos artificiais, precisa ter um cartão magnético de identificação. Eu não entro, porque sou escurinho. Para ter esses bairros exclusivos, emparedados, para ter suas escolas exclusivas que nem por isso são as que dão melhor educação, mas são tão caras que só os ricos podem frequentá-las… E os ricos casam-se entre os ricos. Para casar ‘bem’ também os filhos e perpetuar a linhagem e a dominação. Eles têm seus clubes exclusivos…
Esse é o tipo de elite que manobrou a América Latina. São os poderes que manobraram nossos países, que se traduziram em estados aparentemente burgueses, de fato, aristocráticos, que representam uns poucos, bem poucos, excluindo as grandes maiorias. A Revolução Cidadão implica, basicamente, mudar essa relação de poderes com vistas a atender os cidadãos, em função das imensas maiorias, em função do ser humano, antes do capital. Porque o capital também nos dominou como está dominando na Europa, vale lembrar. E converter esses estados só aparentemente burgueses em estados integrais, populares, que nos represente todos e todas.
Já avançamos muitíssimo, mas tudo ainda pode ser perdido. Essa é a mensagem do povo equatoriano, nesta reeleição. Temos de tornar irreversíveis as mudanças que já alcançamos nas relações de poder, para que, no Equador, os cidadãos continuem a governar como governam hoje. Para que nunca mais voltem a governar, aqui, os banqueiros, os meios corruptos de comunicação, os países hoje hegemônicos, as burocracias internacionais como o FMI e, ainda pior, o capital financeiro – todos os agentes que dominavam e governavam o Equador, antes da Revolução Cidadã.
Trata-se também de mentalidade. Quanto mudou a mentalidade das pessoas, nesse sentido?
Mudou muitíssimo. A senhora dizia, antes da entrevista, que não conhecia o Equador, que só conheceu o país este ano. Mas se tivesse vindo há seis anos, não havia estradas, não havia bons serviços públicos, não havia nada. Recebemos um país destroçado. Mas, mais importante que as estradas, as escolas, os hospitais, as represas, os portos e aeroportos, é a mudança na mentalidade dos equatorianos. Nos haviam castigado tanto, uma oposição com líder político medíocre, uma imprensa que, para nos controlar, roubava-nos qualquer esperança, nos convencia de que éramos os mais inúteis, mais corruptos, mais preguiçosos seres do planeta. Tanto nos bombardearam com esse discurso, que se pode definir a situação, antes, como o país da desesperança.
Essa é a maior mudança que observo: vê-se que as pessoas estão motivadas, orgulhosas do que se faz em sua terra, sentem-se representadas pelo próprio governo, recuperaram a autoconfiança. É o essencial para seguir adiante, mais importante que as estradas e a infraestrutura reconstruída: a atitude das pessoas. E essa atitude mudou radicalmente. Mudança de 180 graus.
Mas eles têm também muita confiança no senhor e em seu governo. Sua popularidade é incrível e continua crescendo. A que se deve isso, depois de tantos anos de governo?
É como diz Cristina Kirchner [presidente da Argentina]: são processos inéditos na América Latina. Antes, um governo vencia eleições com 52% dos votos. Em um ano, o apoio popular despencava para 15%, quer dizer, o desgaste no exercício do poder era muito rápido. Agora é o contrário: o apoio popular consolida-se. Uma das explicações, de nossa querida amiga Cristina é que, afinal, os governos se parecem com o povo. Antes, eram governos que queriam imitar estrangeiros, obedeciam a interesses estrangeiros falavam espanhol, mas pensavam em inglês, quando pensavam. Hoje temos governos honestos, que trabalham, que cometem erros, mas são dedicados, sacrificam-se, amam o país como o amam os que os elegem para representá-los. As pessoas, afinal, sentem-se representadas pelos governos.
Que visão o senhor tem para o Equador dentro de quatro anos? Como vê o país?
Quando sair, quero deixar um país. Obviamente, não conseguiremos resolver todos os problemas. Mas somos o país que mais reduz a pobreza na América Latina; somos o país que mais reduz a desigualdade, e a América Latina é a região mais desigual do mundo. Somos uma das três economias que mais crescem. Somos a economia com menor taxa de desemprego, 4,1%. Mas, apesar de todos esses sucessos, não conseguiremos, nos próximos quatro anos, resolver todos os problemas. Ainda haverá pobreza, desemprego, desigualdade.
O importante é deixar o país posto, irreversivelmente, na trilha rumo à justiça social, ao desenvolvimento, na trilha desse conceito que propusemos ao mundo – o conceito do buen vivir, do bom viver. Para isso, como já disse, o básico é mudar as relações de poder: que o Equador seja governado pelo povo do Equador, não por banqueiros, não por empresas jornalísticas, não por países estrangeiros. Que, no Equador, o ser humano domine. Não o capital.
Senhor presidente, há também quem discorde que a pobreza aumentou, pois há mais gente que recebe a ‘bolsa pobreza’. Queria, por favor, que o senhor explicasse.
É o argumento que a imprensa inventou. É tão infantil. Quem diz que o Equador é o país que mais reduziu a pobreza não é o meu governo: é a ONU. Não são indicadores locais. São números da Comissão Econômica para a América Latina, CEPAL, da ONU. Para desmentir esses números, inventaram um argumento infantil.
Hoje transferimos dinheiro para os mais pobres, principalmente para mães que trabalham em casa, as mais pobres da população. Quando chegamos ao governo, eram 1.200.000; hoje, são cerca de 1.900.000. A imprensa olha esses números e conclui: a pobreza aumentou… Ninguém jamais considera que as estatísticas eram precárias, que a base era errada. Nós corrigimos a base. Incluímos cerca de 400 mil mães excluídas e retiramos da base 200 mil que não deviam estar lá. De fato, foram incluídos novos 200 mil que recebem o auxílio-pobreza. Nos depuramos, corrigimos a base.
A imprensa ‘interpreta’ que há, hoje, mais pobres… Dia seguinte, não há estatísticas de tuberculose. Construímos a pesquisa e a estatística. Descobre-se que há 20 casos de tuberculose. A imprensa ‘noticia’: “Aumentou a tuberculose”. Nada disso. Hoje já temos estatísticas.
Antes, o auxílio-pobreza não era dado aos portadores de necessidades especiais. Agora, com as políticas de vanguarda que se desenvolvem no Equador, cerca de 150 mil deles já recebem essa transferência monetária, que é de 50 dólares. Antes, os idosos não recebiam o auxílio, nem tinham direito a aposentadoria. Dos 700 mil idosos sem aposentadoria que temos no Equador, 500 mil já recebem a transferência monetária.
Some tudo e terá os quase 2 milhões de auxílios que distribuímos. Para os gênios da mídia, significa que a pobreza aumentou. Merecem o Prêmio Nobel de Economia. Veja o nível de oposição e os jornais, jornalistas e redes comerciais de comunicação que temos de enfrentar aqui… A pobreza, aí sim, parece, sem remédio: pobreza intelectual e ética.
O senhor disse também que é seu último mandato. Que se vai, depois desses quatro anos. Não imagino uma pessoa como o senhor, deixando serviço por terminar. Mas é impossível terminar todas essas mudanças em quatro anos.
Sim, mas também há outros que podem continuar construindo a patria nueva. Antes de ser presidente, estive, toda a vida, na Universidade. Era feliz dando aulas, de tênis, jeans, camiseta. E também fui muito feliz na presidência, cuidando de fazer o melhor possível pelo meu povo. Quando me aposentar, se Deus quiser, também serei feliz com minha família. Devo muito à minha família, cuja vida familiar foi muito gravemente perturbada, porque, eu na presidência, minhas filhas perderam privacidade, têm de andar com seguranças, recebem ameaças, ouvem campanhas horrendas de difamação, realmente repugnantes. Então, devo esse tempo à minha família.
E também, como a senhora já disse, minha presença é forte demais. Com certeza não perturbarei a existência de quem venha depois de mim, se continuar na política. É o que menos desejo.
Temos sido muito cuidadosos na preparação de quadros, que venham os novos quadros. Depois desses quatro anos, penso retirar-me, não só da presidência, mas também da vida pública.
O senhor mencionou sua família. Dizem que leva seu filho à escola.
Sim. Hoje cedo, deixei os dois na escola.
Hoje, um dia depois da reeleição? E como encontra tempo para…
RC: Sou rápido. Retomar a vida normal, na medida do possível. Porque, não se engane, tudo isso altera a vida. Minha família não mora aqui no Palácio. Continuamos na mesma casa de classe média, ao norte de Quito. Mas foi preciso instalar segurança, sistemas de vigilância… Tudo isso atrapalha. Há quem goste, mas, para mim, essa é uma das partes mais difíceis da presidência: ter de viver cercado de seguranças, a sensação de perigo sempre iminente, nenhuma privacidade. Além dos que vivem para justificar o próprio ódio: “Correa, odeio você.” E põe-se a inventar ataques, até que … “Ah, já entendi porque odeio você: porque você fez tal coisa…” Têm sempre de provar algum mal, para justificar o ódio. Nada é mais terrível que isso!