Com a vitória de Obama, o mundo respira aliviado depois do persistente noticiário de empate entre os candidatos nas eleições americanas. O belicismo de Bush não terá a escalada de Romney. A conhecida arrogância imperial persistirá, mas não emergirá a loucura do Tea Party.

Iraque e Afeganistão são vulcões em extinção, nos rescaldos. O novo espectro assustador que surge no horizonte é o Irã e sua bomba atômica. Na verdade não é bem o Irã, o risco maior está em Israel e sua enorme capacidade bélica. E seu profundo temor de sobrevivência, que é de todo o seu povo; um temor que tem fundamento histórico nas sucessivas guerras que lhe moveram os muçulmanos desde a sua fundação em 1946, e tem sido agravado pelas estapafúrdias declarações do líder iraniano prometendo varrê-los do mapa. E o temor popular ligado à sobrevivência naturalmente faz crescer a força política da direita, fato que vem ocorrendo em Israel há muito tempo; e a vocação belicista da direita é bem conhecida em todo o mundo.

Sem o apoio material dos Estados Unidos é difícil para Israel ir à guerra preventiva. E Obama talvez não dê este apoio mas insista na política de sanções ao Irã, que está provocando dificuldades internas crescentes e pode levar à disposição dos Aiatolás para um acordo. Há um grau de sensatez nos Aiatolás capaz de gerar essa expectativa. E enquanto prossegue a ação diplomática pode haver um retardamento no projeto iraniano, pode até chegar-se, por entendimento, a uma situação em que eles tenham a capacidade de fazer a bomba mas detenham-se e dêem garantias de contenção, com a contrapartida de Israel, como acontece com a Índia e o Paquistão. E o mundo mais uma vez estará salvo.

Salvo o mundo uma vez mais, é preciso olhar para dentro daquela enorme nação americana imperial e indagar as razões da radicalização política em que mergulhou. Insensata e perigosa radicalização para todo o planeta.

Morreu faz poucos dias, aos noventa anos, o Senador George Mac Govern, que foi candidato à Presidência em 1972, derrotado por Nixon. Foi um marco de esquerda na política norte-americana pelas posições intervencionistas que propunha em busca de um grau maior de igualdade e justiça social. Venerado por uma pequena minoria, entre os quais o nosso estrategista Mangabeira Unger, foi fragorosamente derrotado pela maioria, numa manifestação cabal de crença nacional nas virtudes do mercado e do liberalismo, que só deixa espaço para iniciativas do Estado no campo das armas e da guerra para defender os interesses americanos.

Obama ousou contrariar essa tendência enraizada e começou por propor uma mudança essencial no sistema de proteção à saúde com benefícios aos mais carentes. Foi derrotado no Congresso, acusado de socialista. Na campanha, voltou a assumir compromissos com essa linha reformadora da política americana, com a elevação da carga tributária sobre os mais ricos, mas vai reencontrar a oposição da maioria republicana na Câmara.

Teve na campanha a oposição ferrenha de Wall Street, que jogou uma fortuna na eleição do candidato republicano, com o fim de não ter problemas na sua ação especulativa, livre de regulamentações. Romney teve quatro vezes mais do que Obama, em valor de grandes donativos de campanha! Um escândalo que, com certeza, não passou despercebido para a opinião mais consciente do povo americano. E que também será bem lembrado pelo Presidente durante o eu novo mandato.

Contudo, mesmo que não consiga avanços remarcáveis, Barack Obama representa uma posição mais humanística na política americana que não deixa de se refletir sobre o mundo. Não foi por nenhum acaso que recebeu o Prêmio Nobel da Paz logo no início do seu mandato. Obama é uma promessa; continua sendo apesar da inexpressividade do seu primeiro período. Sua declaração de vitorioso foi de que “o melhor está por vir”. Temos que desejar e esperar que seja isso mesmo.

Roberto Saturnino Braga, ex-senador (PT/RJ), autor de O curso das ideias, editado pela EFPA e membro do Conselho Curador da FPA.