Silvana Abramo: A última vez em que conversei com meu tio.
"Foi em um domingo à tarde, o primeiro do mês de março de 1996, com jeito de visita de família. Só que tinha um motivo especial. Havia recebido um recado de que meu tio Perseu queria conversar comigo e com meu marido, Manoel Ariano, numa continuação da que se iniciara no dia de natal, na minha casa. A Lei nº 9.096 estabelecera, alguns meses antes, o Fundo Partidário e a criação, pelos partidos, de Instituto ou Fundação para a implementação de pesquisa e formação cultural e política. Tio Perseu estava totalmente empenhado em sua estruturação, apesar da doença. Tinha certeza da importância e necessidade desse espaço e vinha desenvolvendo as idéias mestras para a sua efetivação.
Naquele domingo ele nos disse que queria saber nossa opinião jurídica a respeito do melhor caminho a tomar: um Instituto ou uma Fundação. Não era necessária. Ele já sabia a resposta. Discutimos as vantagens e limitações de cada uma dessas possibilidades e confirmamos nossas impressões anteriores. Uma Fundação seria mais adequada aos amplos objetivos de formação política, de centro de estudos sociais, culturais e políticos, de formulação de idéias e de construção e desenvolvimento do pensamento socialista. Seria uma instituição sólida, plural e democrática, com forte comunicação com a sociedade.
Depois a conversa derivou para assuntos afetivos e familiares; ele estava animado e me pareceu bem; melhor do que estivera algum tempo antes, mas antes de sairmos nos disse: “Vocês precisam preparar as crianças… eu não vou viver para sempre.”. Nos despedimos com carinho e saí confiante.
Na madrugada do dia seguinte acordei com a chamada do telefone. "
Setembro 2011
Silvana Abramo, juíza do Trabalho desde 1989 e Desembargadora Federal do Trabalho desde julho de 2010.