A realização da 2a Conferência Nacional de Juventude tem nos municípios seu principal esteio de mobilização. E é muito importante que as juventudes organizadas aproveitem-na para abrir a agenda pública, pressionando, convencendo e sensibilizando os prefeitos de que os jovens precisam de muitas iniciativas envolvendo o poder local, pois ainda que seja intensa a atividade da União, em diversas ações, programas e projetos incidentes para na população com idade entre 15 e 29 anos, ela ainda está longe de dar conta de contemplar os jovens que habitam a vasta quantidade de municípios do país, assim como ainda engatinha a institucionalização das PPJs na esfera municipal.

Por outro lado, por conta do pacto federativo ser draconiano com os municípios na divisão de recursos constitucionais, as prefeituras, quando desenvolvem políticas públicas que de algum modo alcançam os jovens, terminam se limitando à realização de convênios, que embora tenha sido um avanço até aqui, não chega perto do tamanho das possibilidades (e da demanda) de resposta.

É preciso retomar uma agenda municipalista para as políticas de juventude, que identifique o papel das prefeituras e do poder local dentro de uma política nacional.  Nos anos 90, o PT desenvolveu a noção de "Modo Petista de Governar" com um conjunto de marcas próprias de gestão, referenciadas em seu ideário socialista democrático, que poderiam ser sintetizadas na fórmula “inversão de prioridades  com participação popular”. Nesse período, a Juventude do PT conseguiu relativamente demarcar seu espaço dentro deste conceito, conquistando um "recorte juvenil" nesta fórmula, de onde vieram políticas de economia solidária para o primeiro emprego, processos específicos de participação popular juvenil e a inclusão dos jovens como "sujeito de direitos" dentro da visão geral de inversão de prioridades.

Dizer que hoje estamos no auge das PPJs do Brasil é tão correto quanto creditar ao Ocidente a primazia da cultura mundial, ignorando o Oriente e o que foi a síntese helenística anterior à Idade Média.

Hoje, é lamentável que o Partido tenha reduzido sua marca municipal a ter um candidato que "é aliado/amigo" do chefe do executivo federal. Experiências exitosas e importantes, especialmente na área das PPJs foram esquecidas, mas muito podem ajudar a apontar caminhos nesse momento em que está sendo gestada, com desfecho em aberto, a atualização da Política Nacional de Juventude inaugurada por Lula em 2005, com a criação da SNJ, Conjuve e Projovem, sucedidos pela realização da I Conferência Nacional de Juventude.

Interiorizar, territorializar, municipalizar o bônus demográfico

Os municípios, que não são abstrações geopolíticas como “estado” e “país”, e são o território onde de fato os jovens vivem e desenvolvem suas trajetórias diversas e nunca lineares, podem ser a base de um novo modelo de política de juventude, antes estruturada pelo tripé órgão de juventude-conselho-Projovem, mas que alcançou seu limite com a consolidação do programa como uma política educacional de inclusão quando de sua transferência para o MEC.

O momento é propício para essa sensibilização, já que os repasses constitucionais aos municípios cresceram 32% no 1º trimestre de 2011 e as transferências voluntárias do governo federal às cidades chegaram a R$ 811 milhões. Sem falar que a presidenta anunciou a liberação de R$ 750 milhões para o pagamento de obras já iniciadas pelos municípios, tendência de colaboração e investimentos que deve se manter nos próximos quatro anos.

Os municípios têm muito a dizer sobre o novo período que se abre, (re) lançando uma nova perspectiva em sentido geográfico, com enfoque territorial, focado em qualificar a mobilidade e a expressão social das camadas de baixa renda do Brasil, que são majoritariamente compostas por pessoas de 15 a 29 anos, promover o acompanhamento das trajetórias individuais juvenis e começar a moldar a responsabilidade constitucional das cidades e do poder local dentro do debate inadiável e necessário dos marcos legais (Estuto-Plano-Sistema) para que o bônus demográfico seja aproveitado em sua plenitude, sendo "agarrado" em suas minúncias originais: a realidade diversa de identidades materiais e ideológicas juvenis na pólis, que demandam respostas eficazes nesses termos, sob o risco de reduzirmos as PPJs à generalidades artificiais e superficiais, que em nada diferem do trecho da música que diz "a juventude é uma banda numa propaganda refrigerantes", só que em nível governamental. E, claro, partindo da potencialização dessa diversidade de identidades e trajetórias juvenis municipais, territoriais, na medida em que obtenham respostas adequadas, teremos "nitroglicerina pura" para um efetivo bom aproveitamento do bônus demográfico.

Isso também está em consonância com o desafio estratégico lançado em artigo recente – "Uma geração para governar os municípios" – pelo Secretário Nacional de Juventude do PT, Valdemir Pascoal, quando apontou que as eleições municipais propiciam candidaturas mais de base, favorecendo a projeção dos novos quadros que dirigirão o partido em médio prazo e cujo investimento neles é condição sine qua non para ampliarmos e interiorizarmos os 30% de preferência popular que o petismo detêm, que produz as maiores bancadas da Câmara, a força que nos impulsiona ao governo central, mas que precisa ganhar os rincões do "Brasil profundo" para consolidarmos um partido de milhões, dirigente de uma transformação social pretendida que, também, só pode ser obra consciente de milhões em ação.

Uma JPT de milhões e para milhões

Como diretriz geral, acredito serem os desafios principalmente da seara de valorizar a participação popular juvenil, assentado nas camadas de baixa renda em mobilidade social, no processo de reconstrução de cidades, destroçadas historicamente pela ocupação desordenada do espaço urbano – marca do capitalismo – pela política de colonização de regiões na ditadura e, recentemente, pelas consequências econômicas e sociais do neoliberalismo. Elementos que deixaram uma pesada herança social e territorial sobre os jovens.

Em tempos de bônus demográfico, incluir a juventude no planejamento municipal e na reconstrução das cidades é determinar em médio e longo prazo um novo tipo de urbanização e territorialidade, pois é nesse nível que vive 85% da população brasileira, onde ocorre o consumo da quase totalidade dos produtos e serviços que utilizam materiais e recursos provenientes do meio ambiente, na perspectiva da sustentabilidade e democracia urbana, do planejamento social, cultural e ambientalmente justo e correto do espaço.

A JPT precisa construir uma plataforma que proponha aos jovens pensarem seu território e os centros urbanos nos quais desenvolvem suas vidas, recolocando em ótima hora a discussão sobre governança/poder local e juventude, no debate estratégico geracional e assumir essa agenda com fôlego, tendo como ponte tática a sua rearticulação com planejamento, metas e mensagem, via fórum de gestores municipais, alargando-os para os parlamentares jovens, aos que desenvolvem trabalho voltado à juventude, favorecida pelo peso partidário em articulações municipalistas regionais (dentro dos estados) e nacionais como a Frente Nacional de Prefeitos – que abarca as grandes cidades – e a Confederação Nacional dos Municípios, que congrega as pequenas cidades brasileiras.

Portos de partida

Da minha "vista do ponto" – parafraseando Leonardo Boff – destaco um bom referencial para a reconquista de um "Modo Petista de Governar para a Juventude" nos municípios, lembrando os velhos tempos em que haviam paradigmas sólidos constituídos no programa partidário nessa questão: a experiência do Orçamento Participativo da Juventude (OPJ) em Belém (PA).

Um processo de participação popular juvenil, dentro do processo geral instituído pela prefeitura (OP), que integrava os jovens ao planejamento urbano a partir da lógica de reconstrução quase classista da cidade via inversão de prioridades, mobilizando jovens nos bairros e distritos administrativos em torno de demandas juvenis para tais ou quais territórios municipais na área do esporte, cultura e lazer, elementos cruciais do desenvolvimento juvenil urbano.  Além do que trazia elementos ancestrais, com conteúdo mais avançados, àqueles nos quais nos referenciamos hoje, como fundo, conselhos e/ou conferências livres e territoriais de juventude, quando estabelecia reserva de um milhão de reais para as obras do OPJ, decididas diretamente pelos jovens; quando forjou o conceito de "congressos setoriais" para incluir no processo as demandas, com os respectivos olhares juvenis do locus onde pisam, de identidades urbanas próprias, recortadas pela cultura local, como skatistas, "seguidores do Brega", "caboclos socialistas", dentro outros, que elegiam delegações para defenderem suas propostas para a cidade; ou, por fim, quando elegia diretamente no calendário de mobilização social do OPJ uma "coordenação de juventude" e representantes jovens ao "conselho geral da cidade", que eram os responsáveis pelo encaminhamento da pauta das PPJs aprovadas ante o governo, mas, da mesma forma, os organizadores do próprio processo de participação popular juvenil, consistindo num autêntico conselho de juventude sui generis.

Um referencial de esfera pública política não-estatal, de Ação Comunicativa, de massas, concorrente como o mercado como meio de sociabilidade, produtor de soluções e mediador de sonhos, que semeia uma nova cultura política instigadora da participação como forma de influenciar na vida política, anulando o sentimento de que “política é coisa só para os políticos”, estimuladora do sentimento de co-responsabilidade com os destinos da gestão, do controle social sobre a atividade política institucional, sobre a qual este público ostenta os maiores percentuais de descrença. E que tem um grande apelo em relação à transição geracional do ativismo social e do exercício da política em geral, porque estimula a juventude a se organizar para aprovar suas demandas, fortalece as organizações já existentes, articula a juventude que está fora das entidades e organizações tradicionais, traz jovens antes desorganizados e, por isso, cria novas articulações coadunadas com as características conjunturais e estruturais da cidade/território, com visibilidade, para a discussão de suas necessidades, possibilidades e para debates políticos mais aprofundados.

Esses ensinamentos de ontem combinados com conceitos avançados de hoje, como marco legal, bônus demográfico, territorialidade, acompanhamento integral, podem ser a fonte de uma nova era firme e forte para colocar as PPJs no lugar que o Brasil precisa que elas estejam, favorecendo uma Juventude do PT à altura, de fato, dos desafios geracionais e históricos do PT, junto com seus aliados: uma revolução democrática de milhões.

*Leopoldo Vieira é assessor político da Juventude do PT – JPT Nacional