O PT e a crise do ministro Palocci
Para os petistas, não sair em defesa de Palocci foi uma reação contra o risco de distanciamento do PT em relação à sua base social. Por isso estamos com a presidenta Dilma e apoiamos sua dolorosa atitude nesta hora. Mesmo tendo que perder um ministro tão importante, ou tendo que parecer vencida pela pressão das oposições, ela preferiu não perder o sentido social de seu governo.
Para os petistas, não sair em defesa de Palocci foi uma reação contra o risco de distanciamento do PT em relação à sua base social. Por isso estamos com a presidenta Dilma e apoiamos sua dolorosa atitude nesta hora. Mesmo tendo que perder um ministro tão importante, ou tendo que parecer vencida pela pressão das oposições, ela preferiu não perder o sentido social de seu governo.
Os petistas não contestam o direito que Palocci tinha de exercer uma atividade privada quando saiu do governo em 2006 e de ter sucesso nela. O que causou espanto e levou os petistas a não apoiarem sua permanência no governo, foi a origem de seus ganhos privados (orientar os negócios de grandes empresas), a magnitude dos resultados (dezenas de milhões de reais), e o alto padrão de vida que ele se concedeu (representado pelo investimento em moradia fora de sua própria origem de classe média).
Nós, petistas, éramos ‘de fora’ nos tornamos ‘de dentro’ do Estado brasileiro. Até hoje a elite rica ou a classe média alta de doutores não simpatiza com ver lá essa geração vinda dos movimentos de trabalhadores. Somos herdeiros dos esforços que o Partido Comunista representou ao levar em 1945 ao Parlamento trabalhadores historicamente excluídos do poder (por pouco tempo, já que logo posto na ilegalidade). Somos herdeiros daqueles que no início dos anos de 1960 ensaiaram alguma presença no Estado através de suas lideranças sindicais e de partidos socialistas nascentes (tentativa abortada com o golpe militar).
Enfrentamos com muitas dificuldades materiais as eleições. Uma após outra, elegemos homens e mulheres vereadores, deputados, prefeitos, senadores, governadores, até chegar três vezes à presidência da República. Muitos se tornaram assessores nos parlamentos, nos governos, diretores, secretários, dirigentes de empresas públicas, ministros.
Quando estávamos perto do poder ou nele, as empresas privadas ajudaram nossas campanhas e procuraram nos aproximar delas. Queremos o financiamento público dos partidos para não depender delas. Respeitamos os empresários, mas com a devida distância.
Não queremos sair do que fomos. Sabemos que as relações econômicas e as condições materiais de vida terminam moldando ideias e ações. São milenares as reflexões que alertam para isso. Vamos recordar alguns exemplos.
Lá longe, o filósofo grego Platão, em A República, dizia que os governantes das cidades-estado não deveriam possuir bens, exceto aquilo de essencial que um cidadão precisa para viver. Que deveriam ter o ouro e a prata apenas na alma, porque se fossem proprietários de terras, casas e dinheiro, de guardas que eram da sociedade se transformariam em mercadores e donos de terras, então, de aliados passariam a inimigos dos outros cidadãos.
A Revolução Francesa no fim do século 18 fez brilhar pela ação dos excluídos as ideias de igualdade, fraternidade e liberdade, contra a concentração da riqueza e do poder nos reis, na nobreza e no clero. É verdade que depois houve a restauração do Império, mas também se fortaleceram as ideias socialistas.
Marx e Engels, que buscavam a emancipação do proletariado, consideravam que, para modificar a consciência coletiva era preciso modificar a base material da atividade econômica. Não bastava, portanto, a crítica das ideias, porque o pensar das pessoas reflete seu comportamento material.
Filósofos sociais posteriores, mesmo aqueles cujas ideias deram suporte ao liberalismo, como Max Weber, falavam de estamentos sociais definidos pelos princípios de seu consumo de bens nas diversas formas de sua maneira de viver.
Já dizia Maquiavel que a política se altera no ritmo incessante das ondas do mar. Os partidos tendem a ser como estas ondas: vem de muito longe, vem crescendo, até que um dia se quebram mansamente nas praias ou mais rudemente nos rochedos. Defender vida modesta para políticos vindos da vida modesta das maiorias, é para o PT uma das condições indispensáveis para comandar um processo de distribuição da renda e inclusão das multidões excluídas, embora não a condição única. Para cumprir esta condição e nosso papel, é essencial sermos, como temos sido: fiéis, na nossa vida pessoal e política, aos milhões e milhões de brasileiros que tem votado e confiado em nós. É legítimo para nós progredir ao longo da vida, desde que todos cresçam na mesma medida em que o bem-estar do povo cresce.
Voltando ao companheiro Palocci: respeitamos suas opções, admiramos sua competência, reconhecemos seu trabalho a serviço do povo. Mas, pelas razões expostas, o PT mostrou que prefere o político de vida simples que conhecemos, ao empresário muito bem sucedido sobre o qual agora se fala.
Nesse mix de filosofias sobre a riqueza e seu reflexo no pensamento social, terminamos lembrando o imperativo categórico de Kant: aja de tal modo que a máxima de sua ação possa ser universalizada, isto é, para que todos sejam iguais a você. Por isso que, para continuarmos a ser um partido dos trabalhadores, não é bom que cultivemos o ideal de empresários.
*Elói Pietá é secretário geral nacional do PT.