Desafios do investimento
Mesmo os economistas e observadores mais céticos não têm muito do que reclamar da economia brasileira nesta entrada de 2010.
Mesmo os economistas e observadores mais céticos não têm muito do que reclamar da economia brasileira nesta entrada de 2010.
O Brasil soube aproveitar suas recém adquiridas condições econômicas: reservas internacionais em expansão, crescimento econômico com distribuição de renda e valorização do mercado interno, setor financeiro estabilizado e bancos públicos fortalecidos, investimento em expansão e inflação sob controle, entre outras. E contrariamente ao ocorrido durante as crises menores dos anos 1980 e 1990, o governo federal enfrentou a recente crise internacional com políticas monetárias e fiscais anticíclicas inovadoras.
Os próximos anos serão anos de retomada do processo de desenvolvimento, do crescimento econômico sustentado e da redução das desigualdades. Mas para que isso se consolide e mantendo o indispensável controle inflacionário, teremos que assegurar a ampla retomada dos investimentos públicos e privados.
Já antes da crise, o PAC articulou os investimentos públicos e privados e definiu prioridades, favorecendo a elevação da taxa de investimento relativamente ao PIB para cerca de 19%. Com a crise esta relação caiu, mas já se recupera e o PAC 2 deve abrir espaço para sua consolidação e indispensável ampliação.
O crédito direcionado, desde antes da crise comporta-se bem, seja aquele de longo prazo oferecido às empresas, seja aquele destinado à habitação e saneamento ou ao setor rural. O governo federal soube mobilizar as instituições diretamente envolvidas (BNDES, CAIXA e BB), favorecer o acesso das empresas e das pessoas ao crédito e assegurar a extraordinária expansão do crédito direcionado.
Em contrapartida, o crédito livre despencou com a crise. Embora tenha melhorado recentemente, sua lenta recuperação indica que os bancos privados ainda não se recuperaram de sua maior aversão ao risco. O fraco desempenho do crédito livre em novembro e dezembro de 2009, fez com que a participação dos bancos privados no total do crédito recuasse no último mês do ano para pouco mais de 38%, contra mais de 61% dos bancos públicos.
Frente ao risco de contração do crédito, da liquidez e dos investimentos, o governo federal reforçou o caixa do BNDES, reduziu o compulsório dos bancos, cortou juros, criou novo programa habitacional (Minha Casa Minha Vida) e fortaleceu o PAC.
No entanto, com as taxas de crescimento do PIB projetadas para os próximos anos, certamente teremos que olhar o crédito e o financiamento do desenvolvimento com outros olhos.
Mesmo países que dispõem de um mercado de capitais desenvolvido e crédito bancário de longo prazo, sempre que há um aumento do investimento, a questão do financiamento torna-se um problema.
Para o Brasil, o desafio de se alterar o padrão de financiamento do investimento é ainda maior. Aqui, não dispomos de crédito de longo prazo do sistema bancário privado, o FGTS e a poupança ainda são as principais fontes de financiamento ao desenvolvimento urbano, o coeficiente crédito/PIB é notavelmente baixo – apesar da importância do setor bancário na economia – e o mercado de capitais ainda não alcançou relevância no financiamento às empresas do país, salvo alguns segmentos. Com o indispensável aporte de recursos do Tesouro ao BNDES – 100 bilhões de reais em 2009 e prometidos 80 bilhões em 2010 – ampliou-se o custo fiscal, pois enquanto o Tesouro capta à taxa básica de juros (SELIC), que está hoje em 8,75% a.a., o BNDES empresta às empresas cobrando TJLP, que está em 6% ao ano.
Esse padrão e estrutura do financiamento ainda hoje vigente, precisa ser transformado ou o investimento dificilmente romperá a barreira dos 20% do PIB.
O maior desafio para a aceleração das taxas de investimento – processo absolutamente indispensável à sustentação do crescimento – será enfrentar estrategicamente essa questão e buscar um novo padrão de financiamento. E não bastam pequenas inovações financeiras.
Para iniciar esse processo, precisam ser viabilizados amplos fundos capazes de articular as distintas fontes de recursos disponíveis no cenário brasileiro. Às atuais fontes de recursos (FAT, FGTS, poupança, Tesouro, etc.), deveriam ser articulados tanto um menor estímulo à aquisição de títulos públicos e a busca de uma maior participação dos bancos privados, quanto os recursos dos fundos de pensão, dos fundos de investimentos nacionais e estrangeiros, das agências multilaterais e do mercado de capitais.
Iniciar esta articulação antes que as atuais fontes de financiamento se esgotem ou se mostrem insuficientes, é agenda imperiosa, que todos envolvidos – pretendendo dar continuidade a esse histórico e recente crescimento sustentado e inclusivo – precisam enfrentar.