Entrevista: Biscaia – Combate ao crime organizado deve ser permanente
O deputado Antônio Carlos Biscaia (PT-RJ), ex-secretário Nacional de Segurança Pública, disse ontem que as ações de combate ao crime organizado no Rio de Janeiro devem ser permanentes. Especialista em segurança pública, o parlamentar aposta na integração entre as polícias Militar, Civil e Federal. Ele defende ainda a união entre governos federal e estadual para combater o crime organizado.
Biscaia aponta o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci) como saída para a reversão do grave quadro de violência no estado.
No último sábado (17), um helicóptero da polícia foi abatido pelos traficantes no Morro dos Macacos, em Vila Isabel, na Zona Norte do Rio. Três militares que estavam a bordo morrera.
Por Edmilson Freitas
O que deve ser feito para contornar o quadro de violência no Rio de Janeiro?
Temos que prosseguir executando o Pronasci (programa desenvolvido pelo Ministério da Justiça e que articula políticas de segurança com ações sociais priorizando a prevenção) como prioridade para o Rio. A Polícia Federal já foi fortalecida no governo Lula, passando de 8 mil homens para 14 mil. Temos que focar na questão do desarmamento e, ao mesmo tempo, trabalhar no aprimoramento da inteligência policial e do sistema de investigação. São providências que irão a médio prazo alterar este quadro.
Que tipo de resultados o Pronasci poderia produzir neste cenário?
Nós já temos experiências bem sucedidas em que a proximidade das polícias resultou na pacificação de algumas comunidades violentas do Rio. Hoje, nos morros Santa Marta, Chapéu Mangueira, Cidade de Deus e na favela do Batan, o crime organizado foi afastado devido à política de proximidade com as comunidades. No entanto, estamos falando apenas de quatro comunidades, e o estado tem entre 800 e 1.000 dessas regiões de conflito. É um trabalho que vai exigir um esforço muito grande e a continuidade nesta parceria para levar este modelo para outros locais.
O Brasil tem condições de reverter este quadro antes das Olimpíadas de 2016?
Isso exigirá um trabalho permanente de combate ao crime. Não podemos mais apenas reagir aos ataques e emergências. Em 1992, as Forças Armadas se mobilizaram e houve calmaria, mas logo depois a situação se agravou. Em 1994 e nos Jogos Panamericanos de 2007 aconteceu da mesma forma. É interessante observarmos que a grande imprensa, os parlamentares e a opinião pública só se manifestam quando ocorrem tragédias, como a morte daquele garoto que foi arrastado pelas ruas. Hoje mesmo devem aparecer dezenas de projetos prevendo até pena de morte para quem atirar em helicóptero. Não é esse o caminho. Temos que adotar políticas permanentes e sempre com integração entre os governos federal e estadual. Também é indispensável a integração entre as polícias Militar, Civil e Federal. Não pode haver nenhum tipo de visão corporativa. Também é importante ver qual o papel do Ministério Público nisso tudo. Se ficarmos na disputa para saber quem tem mais poder, não iremos contribuir em nada para modificar este quadro.
O presidente Lula garantiu que dará todo o apoio para o estado combater o crime organizado. Está havendo alguma falha de comunicação entre os governo estadual e federal?
Desde 1983, com o agravamento da segurança pública no Rio, tivemos uma sucessão de governos que se confrontaram com o governo federal. Isso contribuiu para a situação atual. Considero que a partir de 2007, com a eleição do governador Sérgio Cabral, essa parceria está sendo realizada. O governo federal já tem consciência deste papel há muito tempo. O Pronasci, que foi instituído no primeiro mandato do presidente Lula, já considerava a situação do Rio como prioritária. O governo tem consciência de que deve contribuir nas diretrizes de segurança pública em apoio a todos os entes federados. A declaração do presidente Lula apenas confirma isso. No entanto, o quadro que vem de mais de 20 anos não vai ser modificado de uma hora pra outra.
O Brasil tem uma legislação que assegure o combate ao crime organizado?
Já temos leis suficientes. De qualquer maneira, se alguma coisa tem que ser aprimorada, não é a legislação penal para aumentar penas, mas, sim, para alterar os procedimentos, para que haja uma investigação mais adequada. Temos que pensar em maior agilização dos procedimentos criminais. A pena tem como objetivo educar e ressocializar o indivíduo.
Entrevista publicada no Boletim Informes nº 4345 de 21/10/2009