A adesão dos 27 governadores e 5.563 prefeitos ao Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), do governo federal, pode passar a falsa impressão de que há consenso acerca do que precisa ser feito pela educação brasileira.

De fato, o Ministério da Educação, de comum acordo com os gestores locais, definiu 28 diretrizes, como avaliação por escola, escolha criteriosa de diretores, obrigatoriedade de aulas de recuperação para alunos defasados, regulamentação do estágio probatório, valorização do mérito e da carreira de professor, promoção da educação infantil etc.

Além disso, fixou para o país, para cada rede e cada escola metas de qualidade, valendo-se do Ideb, indicador de qualidade que combina o resultado dos exames nacionais de proficiência em matemática e leitura e as taxas de aprovação.

Havia grande resistência na divulgação dos resultados por escola, mas mesmo os governos estadual e municipais que não aderiram à Prova Brasil em 2005 foram vencidos pela evidência de que esse é um direito das famílias que contribui para a melhoria da qualidade e da gestão da educação. Contudo, se há acordo em relação a diretrizes e metas, o mesmo não pode ser dito em relação a estratégias.

O Brasil, dessa forma, se transformou num enorme laboratório em que várias concepções de educação vão sendo testadas, e experiências, trocadas, tendo como pano de fundo o direito fundamental do aluno de aprender.

É possível, dois anos após o lançamento do PDE, agrupar essas estratégias em torno de dois eixos: um mais progressista e um mais conservador. Mais ou menos financiamento? Os especialistas se dividem. Alguns defendem que o patamar herdado de investimento público em educação como proporção do PIB, de 4%, é suficiente e que o problema reside na gestão desses recursos. Outros defendem a ampliação dos investimentos para, no mínimo, 6%, com melhor gestão. O governo federal pretende atingir, em 2010, a meta de 5%, em trajetória ascendente.

Os conservadores, na reforma tributária, trabalham nos bastidores pela desvinculação de receitas dos Estados para a educação, a chamada DRE; os progressistas comemoram a iminência do fim da DRU, dispositivo constitucional que, desde 1995, retira mais de 20% do orçamento do Ministério da Educação. Avaliação para quê? Premiar e punir, sugerem alguns. Aqui há que considerar certos aspectos. Se não acompanhado de aumento do financiamento, mais recursos para escolas que cumprem metas de qualidade pode significar menos recursos para as que não cumprem. Isso pode implicar punir uma segunda vez alunos de escolas que não avançam.

Outra possibilidade é aquela que, ao ampliar o financiamento, promove as transferências adicionais de recursos, combinando a lógica do mérito à da colaboração: repasses automáticos para escolas que cumprem metas, ampliando sua autonomia, e repasses condicionados à elaboração, com apoio técnico, de um plano de desenvolvimento pedagógico e formação de professores para escolas cujos indicadores de qualidade as situem abaixo da média. O MEC, desde 2007, de forma pioneira, repassa diretamente recursos adicionais para as escolas públicas do país utilizando esse critério.

Por fim, o mais importante: a questão dos professores. Uma ala faz recair sobre os ombros do magistério toda a responsabilidade pela baixa qualidade do ensino. As instituições de ensino superior que os formam e os gestores que os contratam quase nunca são lembrados, embora baixos salários, contratos temporários e formação inicial e continuada precária sejam a regra em nosso país. Reforça-se, assim, aquilo que Theodor Adorno chamou de “tabus acerca do magistério”, num ensaio mais do que atual.

Noutro polo estão os que entendem que “os melhores professores do Brasil são os professores do Brasil” e que a guerra contra a má qualidade do ensino se ganha com eles, e não contra eles. Defendem o piso nacional do magistério, constroem a carreira com a categoria e procuram corresponsabilizar a classe política e as instituições formadoras pelos destinos da educação.

Nessa direção, o Ministério da Educação, a partir de 2005, divulga o Ideb de cada rede de ensino às vésperas de cada eleição e, por meio do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes), fecha cursos de licenciatura de baixa qualidade. Como se vê, o Brasil deu importantes passos, mas há muito debate pela frente.

*Fernando Haddad é advogado, mestre em economia, doutor em filosofia e professor de teoria política da USP, é ministro da Educação.

Publicado no jornal Folha de S.Paulo,em 29/03/2009, na coluna Tendências/Debates.