Ao professor Hélio Jaguaribe

Fomos levados ao pelourinho das palavras.
Ao açoite público sob a luz impiedosa da tarde.
Arrastados pelas ruas.
Atados às patas dos cavalos.

O sangue, o sal, a carne em postas,
exposta ao sol para o horror dos olhos:
a aterradora pedagogia do medo
gritando no alto dos postes da imensa Vila Rica.

De onde brota a sinistra raiz desse ódio?
Do édito
– que não concebe a recusa.
Dos punhos de renda
– que rejeitam a mão que a moenda mastigou.
Do senhor
– que não tolera o gesto insubmisso.
Da voz
– que arma a mão do feitor.

Essa que maneja a lava da palavra
e dissolve com seu fogo os passos que cumprimos.
Sonham, senhores e áulicos, nos converter em cinzas
e nos lançar aos ventos definitivos.

Mas, dobramos a esquina e nos recompomos
na voz de um peão
que ecoa a força dos séculos
na pedra da praça e nos redime.

Sitiados pelo silêncio
– o silêncio aqui são os rios da palavra morta
ditada à diário ante os nossos olhos –
rompemos o submisso idioma do conformismo.
Invadimos a terra cercada e os espaços do mando.

Recriamos o espaço das ruas
( e das redes virtuais que a ordem não captura…),
Carregamos por elas bandeiras de liberdade.
Desafiamos o pelourinho.
Já não dobramos o dorso,
já não baixamos os olhos.

Com o corpo coberto de cicatrizes,
portando estrelas no peito,
nos olhos a invencível vocação de mar,
nós, os primitivos
voltamos
e somos milhões.

*Pedro Tierra (Hamilton Pereira) é presidente da Fundação Perseu Abramo

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